Angolanas e angolanos
Minhas
senhoras e meus senhores:
Dentro de três
semanas vamos celebrar 38 anos de independência, numa altura em que caminhamos
céleres para o fim do décimo segundo ano consecutivo de paz
militar.
Volvidos todos
estes anos, vemo-nos hoje, no exercício do direito democrático de oposição, a
apresentar a nossa réplica política ao discurso sobre o estado da Nação
proferido pelo Senhor Presidente da República na Assembleia Nacional, no início
da semana passada.
O estado da Nação
que o Presidente da República descreveu, não é, certamente, o estado desta nossa
Angola. É o estado em que se encontra uma outra Angola, uma Angola virtual,
imaginada nos gabinetes, longe da realidade, que não dialoga com as pessoas e
não conhece, por isso, o seu sofrimento.
Se por um lado, o
senhor Presidente da República omitiu factos relevantes como os persistentes e
tão badalados problemas do abastecimento de água e da habitação e apresentou uma
imagem distorcida da dimensão da pobreza e da natureza da corrupção, por outro
lado, o senhor Presidente da República confirmou que ele próprio é o principal
factor da instabildiade política e social que Angola vive.
Nós vamos sustentar
esta afirmação com alguns exemplos concretos da vida real dos angolanos em todo
o país.
SOBRE A PAZ E A
DEMOCRACIA
Concordamos com o
senhor Presidente quando diz que a paz e a democracia são os fundamentos da
estabilidade política.
Onze anos depois da
conquista da paz militar, o Executivo utiliza novas armas para atacar os
angolanos. São as armas da tirania, da exclusão social, da promoção de falsos
valores, dos assassinatos selectivos e da alienação cultural. Elas são apontadas
e disparadas todos os dias contra os angolanos, especialmente contra A JUVENTUDE
e os mais vulneráveis.
O que vimos hoje
nas aldeias do país são autênticos atentados à paz e à democracia: O Executivo
segrega as pessoas na base da sua filiação político-partidária até na prestação
de serviços públicos básicos. De um lado coloca os cidadãos filiados no MPLA, do
outro os cidadãos fiiados nos outros partidos, com destaque para os filiados na
UNITA. Até na distribuição de sementes e de fertilizantes, esta segregação é
praticada. Quem é do MPLA recebe sementes e adubos do Estado. Quem é da UNITA, é
excluído.
Testemunhei isso eu
próprio e, recentemente, ouvi atentamente as reclamações dos anciãos, das
mulheres e dos jovens no Umpulo, no Rigoma e na província do Moxico.
Uma senhora, no
Município dos Bundas, na província do Moxico, cujo nome omito propositadamente,
perdeu o filho por causa do apartheid que se verifica na política de
saúde praticada pelo Executivo: ali no Luvuei, na Província do Moxico, quem é do
MPLA, tem direito a assistência médica no Hospital público. “Quem for da
UNITA e for ao Hospital, vai morrer”; diz sem pestanejar, segundo os anciãos
da comuna, o Administrador comunal, Senhor Manuel Tchimboma, que é o
representante do Presidente José Eduardo dos Santos na Comuna.
A senhora levou o
seu filho ao Hospital. O enfermeiro recusou-se a tratar a criança, só porque a
mãe é da UNITA. Vão ao Samakuva para vos tratar. Eu cumpro as ordens superiores
do senhor Administrador. Segundo os anciãos com quem conversei, mesmo perante
inúmeros pedidos e diligências, durante vários dias, o enfermeiro foi
peremptório em afirmar que cumpria ordens superiores, do Senhor Administrador.
Infelizmente, dias
depois, a criança acabou por falecer.
Os doentes daquela
Comuna, sejam da UNITA ou não, ganharam aversão aos Hospitais. Na fuga
desesperada da morte nos Hospitais, muitos estão a morrer em casa ou em pequenas
clínicas privadas, algumas sem condições, vítimas de patologias simples que,
entretanto, podiam ser tratadas nos hospitais. Dizem-nos que os hospitais se
transformaram em comités de especialidade do partido, tornando-se perigosos para
os que não fazem parte do partido dos que sustentam os comités de especialidade.
O verdadeiro estado da Nação, é que as pessoas estão a fugir dos hospitais,
porque muitos deles tornaram-se locais de mortes cuja justificação não tem sido
compreendida . Dizem-nos que as pessoas vão aos Hospitais com doenças simples,
depois são obrigadas a ficar internadas e saem de lá mortas. Verdade ou não, são
estas as preocupações que os cidadãos nos colocam com frequência. E isto sucede
um pouco por todo o lado.
Há muitos outros
relatos que ilustram o estado doentio da Nação. É verdade que estão a ser
construídos novos postos de saúde. Mas são mal geridos e não têm medicamentos.
Os doentes morrem nos corredores dos hospitais.
Este é o real
estado da Nação no que toca à saúde. Se o Representante da República não sabe,
então que fique sabendo agora e tome medidas, porque este é o real estado da
Nação!
Prezados
compatriotas:
A paz é diálogo; é
respeito ao próximo, à sua liberdade e à igualdade básica que existe entre nós.
A democracia é a garantia da autenticidade e do verdadeiro respeito por essa
igualdade e liberdade.
Isto significa que
quem proíbe a liberdade de imprensa, quem impede a comunicação social pública de
veicular o pluralismo de expressão política e tratar por igual os Partidos
Políticos, está a atentar contra a democracia. E quem atenta contra a
democracia, atenta contra a estabilidade.
Significa também
que quem, como representante da República, nem sequer se pronuncia
sobre os desaparecimentos de cidadãos como Isaías Cassule e Kamulingue, sobre
prisões arbitrárias nem sobre assassinatos de políticos, está a atentar contra a
estabilidade política.
Quem utiliza o
poder público para ordenar a segregação das pessoas segundo a sua cor partidária
para nesta base prestar-lhes ou negar-lhes serviços públicos, atenta contra a
estabilidade política.
Por outro lado, os
Administradores Municipais, que são pagos para governar para o povo, para cuidar
dos problemas do povo, foram transformados am agentes partidários. Estão mais
envolvidos em realizar acções político-partidárias do que em administrar os
assuntos públicos.
No mês passado,
quando passamos pelo Ringoma, Umpulo e pela Chicala, na Província do Bié, vimos
os Admnistradores locais ordenar que se montassem barreiras nas aldeias para
impedir as pessoas de dialogar com o Presidente da UNITA.
Era um dia de
trabalho para o governante. Ao invês de estar a trabalhar, o Administrador
resolveu ir fazer um Comício para dizer aos cidadãos que os angolanos da UNITA
não têm direitos de cidadania. Não podiam exercer o direito de reunião no centro
da cidade. “O lugar deles não é aqui, é lá, à saída...para irem às matas mais
rapidamente..”, dizia o representante do Presidente da
República!
Mas esta política
de aprofundamento da exclusão não se limita à saúde nem às actividades políticas
nas zonas rurais.
O Presidente disse
que, cito, “queremos afirmar-nos como ‘País do
Desporto’!
Ora,
o
detentor imbatível do Oitavo Título de Campeão Africano das Artes Marciais
Mistas, é angolano. Venceu invicto oito combates consecutivos. Reside na África
do Sul e seu talento é reconhecido internacionalmente. Já esteve em Luanda
promovendo seminários para despertar nas camadas jovens angolanas o interesse
pela modalidade.
Mas não encontrou
da parte do Executivo nem da imprensa pública o devido apoio. E porquê? Porque
não é filho do MPLA. É filho da UNITA. Chama-se Demarte Pena e é filho de
Arlindo Chenda Pena “Ben Ben”, que em vida foi o Vice-Chefe do Estado Maior
General das FAA, portanto, neto do Dr. Jonas Malheiro Savimbi.
Tanto na política
de desporto, como na política do emprego, saúde e educação, o regime do
Presidente Eduardo dos Santos decidiu aprofundar a exclusão ao invés da
reconciliação. Decidiu atentar contra a paz e contra a unidade da Nação.
Este é o real
estado da Nação.
Ao afirmar no seu
discurso que “a paz e a democracia são os fundamentos da estabilidade política”
e, pela sua prática, atentar contra a paz e contra a democracia, o Senhor
Presidente da República está a afirmar-se e a constituir-se, ele próprio,
no principal factor de instabilidade política em Angola.
SOBRE
OS DIREITOS HUMANOS
No
seu discurso, o Presidente da República não descreveu o estado da Nação no que
diz respeito às violações dos direitos humanos pelos seus agentes, incluindo
polícias, procuradores e juízes, envolvidos em «manipulações judiciais» contra
os autores de denúncias, jornalistas que investigam casos de corrupção e
activistas dos direitos humanos.
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->Há
indiscutíveis evidências de desaparecimento de dissidentes, detenções e prisões
arbitrárias, desalojamentos forçados, expropriação ilegal de terras e outras
violações sistémicas dos direitos humanos, praticadas pelo Executivo do
Presidente José Eduardo dos Santos;
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->Os
Tribunais em geral deixaram de ser instrumentos do povo ao serviço da justiça
tendo-se transformado em instrumentos da ditadura do poder político;
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->Há
violações sistémicas do direito à liberdade e ao pluralismo de
informação.
Ainda
assim, Angola ‘tem a cara de pau’, como se diz na gíria, de pretender afirmar-se
como guardiã internacional dos direitos humanos e membro do Conselho de
Segurança das Nações Unidas.
Ameaçando
ela própria a segurança dos seus próprios cidadãos, todos os dias, sendo ela uma
ameaça evidente para a paz e segurança dos povos de Angola e de África; como
ousa garantir a paz e a segurança no mundo?
Não
seria melhor garantir primeiro a Paz e a Segurança dos seus próprios cidadãos?
Não seria melhor garantir primeiro o respeito pelos direitos e liberdades dos
seus próprios cidadãos?
Defendemos
a ética acima dos interesses políticos. E condenamos a prática de se pintar as
ditaduras com o verniz da hipocrisia.
ARMAS
QUÍMICAS
Ainda
no domínio dos Direitos Humanos, há uma questão importante sobre a qual
gostaríamos que o Senhor Presidente da República se
pronunciasse:
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->Angola
tem ou não tem no seu arsenal armas químicas de destruição em massa, capazes de
causar um número elevado de mortos numa única utilização?
Chegou
ao nosso conhecimento que o Presidente Eduardo dos Santos terá adquirido armas
na forma de gazes, medicamentos ou outros compostos químicos para utlizar contra
os angolanos que eventualmente se manifestem contra o seu
regime.
Parte
do stock dessas armas teria vazado ou estaria a ser eventualmente testado em
seres humanos, provocando os desmaios de crianças nas escolas e outras
consequências graves que o Governo não revela.
Falei
com os pais de algumas crianças afectadas e soube que alguns deles evacuaram as
suas crianças para fazer testes no estrangeiro. Até hoje, seis meses depois, as
crianças continuam a sentir os efeitos dos químicos nos seus corpos e os médicos
não conseguem identificar a causa dos desmaios.
Se
há uma ligação directa ou indirecta entre as armas químicas e os desmaios das
crianças nas escolas, não sabemos. O que sabemos são três factos
relacionados:
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->o
povo diz que a Polícia manda os sinistrados ficarem calados e não falar sobre o
assunto.
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->As
armas que o Presidente terá adquirido para utilizar contra os manifestantes
pacíficos estão proibidas pela Convenção das Nações Unidas Sobre a Produção,
Desenvolvimento, Armazenamento e Uso de Armas Químicas.
<!--[if !supportLists]-->·
<!--[endif]-->189
países já ractificaram ou assinaram essa Convenção, mas Angola, apesar de fortes
insistências, não quer assinar a Convenção das Nações Unidas Que Proíbe o
armazenamento e uso de Armas Químicas. Angola
não quer comprometer-se a não utilizar tais armas.
Porquê?
Se
Angola afirma-se defensora dos direitos humanos e quer contribuir para a paz e
segurança do mundo, porque é que não assina a Convenção que proíbe o uso de
armas químicas?
Eu
convido aqui e agora o Senhor Presidente da República a informar os angolanos se
Angola tem ou não tem armas de destruição massiva.
Tendo
ou não, não faz sentido que Angola esteja no grupo dos poucos países déspotas,
como a Síria e a Coreia do Norte, que não assinaram a Convenção. Por isso,
instamos o Representante da República, no interesse da paz e da segurança
internacionais, a assinar a Convenção das Nações Unidas Sobre as Armas
Químicas.
SOBRE A
ECONOMIA
O Senhor Presidente
falou da estiagem, das taxas de juro, dos milhões de alunos matriculados. Citou
muitos números mas não disse o essencial.
E o essencial, tal
como afirmam os economistas e também o Relatório do Banco Mundial sobre a
Competitividade em África, é que a estrutura económica de Angola continua muito
desequilibrada: agricultura, pecuária, pescas e florestas com 10% do PIB, a
indústria transformadora com 6%, a indústria mineral (petróleo, diamantes e
outros) com 54% e os serviços com 30%.
O essencial é que,
desde 2002, já foram investidos mais de 50 mil milhões de dólares na
construção/reabilitação/modernização das infraestruturas. Mas isso não evitou
que Angola ocupasse a última posição neste item. É uma séria deficiência, que
constrange o funcionamento mais eficiente da actividade económica em qualquer
país, tornando mais elevados os custos dos bens e serviços.
Das duas uma: ou as
prioridades foram mal definidas, ou muito desse dinheiro foi desviado para
“acumulação primitiva de capital” da elite política, como admitiu o Presidente
no seu discurso.
O essencial é que
no mesmo período terão sido gastos apenas cerca de 6 mil milhões de dólares na
criação do capital humano (educação, saúde, pesquisa, inovação), ou seja menos
de 12% do que foi investido nas infra-estruturas.
Aqui está um dos
grandes desequilíbrios de que padece a nossa economia. Olhando para os pilares
«Saúde e educação primária» e «Educação superior e formação profissional», a
melhor posição que se consegue é a 120.ª, no atributo da taxa de escolarização
primária (em quantidade e não em qualidade).
Quando
nas escolas os professores apresentam-se bêbados nas aulas, os directores fazem
vista grossa à “gasosa” para caucionar a fraude e nas universidades se fabricam
licenciados em série incapazes de exibir pensamento crítico e escrever
fluentemente, e o representante da República se orgulha em apresentar dados
sobre a quantidade de matriculados, temos de admitir que o nosso sistema de
ensino FALIU E NÃO SERVE AS NECESSIDADES DA ECONOMIA!
Sem investimentos
sérios e massivos na criação de capital humano, não haverá crescimento
sustentável e Angola não será competitiva, porque não haverá
industrialização.
Se não invertermos
a política actual para permitir que
o petróleo financie a criação de capital humano, a auto-suficiência alimentar e
a industrialização de Angola, não haverá diversificação da
economia.
SOBRE
A CONTA GERAL DO ESTADO
O
que o Presidente submeteu ao Parlamento, pela primeira vez em 34 anos, não é
ainda a Conta Geral do Estado que a Lei manda apresentar.
O
Presidente não apresentou os relatórios de execução necessários à justificação
de mais de 70 por cento do orçamento gasto. Nem o relatório dos seus próprios
gastos.
Não
identificou no seu Relatório os reais titulares dos chamados investimentos de
Angola, feitos com fundos públicos, e que se encontram espalhados
por Portugal, Estados Unidos, Rússia, China e inúmeros Paraísos
fiscais.
O
Presidente não forneceu elementos para a entidade fiscalizadora aferir da
transparência, competitividade e probidade das transacções comerciais do Estado.
Além
disso,
não submeteu as contas a apreciação prévia do Tribunal de Contas, como manda a
lei.
Deste
modo, como já alguém referiu, ‘o Presidente José Eduardo dos Santos cumpriu mais
um ciclo de ilusionismo político e gestão enganosa’.
SOBRE A
CORRUPÇÃO
Prezados
compatriotas:
A
postura adoptada pelo Presidente da República em relação à corrupção transmitiu
aos angolanos o real estado da nação:
A
ideia com que os angolanos ficaram é que o véu que cobria o rosto da corrupção
em Angola foi levantado e as pessoas agora já não têm dúvida nenhuma sobre quem
é o mentor e o defensor da corrupção em Angola. Seja na forma de clientelismo,
nepotismo ou peculato!
Quando
alguém, nas vestes de Presidente da República, utiliza o poder público para
nomear seu filho o principal gestor de um Fundo Soberano, sem qualquer
fundamento, isto é corrupção!
Quando
alguém, nas vestes de Presidente da República, utiliza o poder público para
entregar património público à sua filha para esta investir em negócios privados,
isto é corrupção!
Quando
alguém, nas vestes de Presidente da República, utiliza o poder público para
interferir nas investigações judiciais de indivíduos suspeitos, ou para ameaçar
e chantajar governos estrangeiros, só para proteger interesses privados,
isto é corrupção!
Aproveitamos
esta ocasião para saudar as propostas que circulam nas instâncias da União
Europeia que visam responsabilizar os indivíduos de qualquer nacionalidade,
presentes no seu território, que sejam responsáveis por actos de corrupção ou
peculato de fundos públicos, independentemente do local em que o crime tenha
ocorrido, desde que o produto dessas actividades criminais seja detectado, ou
tenha sido branqueado, no Estado-Membro em questão, ou essa pessoa mantenha uma
«ligação estreita» com esse país.
Prezados
compatriotas:
Os
angolanos não estão distraídos. Os angolanos sabem que é bom que o país tenha
grupos económicos fortes e competitivos. Os Angolanos querem a afirmação de
Angola no mundo e a sua competitividade. Mas com dinheiro limpo. Dinheiro
legítimo.
Os
angolanos querem que haja transparência e verdade. Os angolanos exigem que
se separe o trigo do joio, como disse o Presidente. Mas o que significa
separar o trigo do joio?
Significa
separar o dinheiro público dos dinheiros privados. Significa não desviar fundos
públicos, do Estado, para entregar aos filhos, amigos ou a correligionários,
para enriquecimento ilícito, chamando-os ‘investimentos angolanos’ ou ‘capital
privado’!
Este
é o trigo que deve ser separado do joio, Senhor Presidente! O que é de todos
nós, ou seja, do Estado, de um lado! O que é privado, legítimamente privado, do
outro lado!
Todas
as crianças do secundário sabem que criar empresas nacionais fortes e
competitivas, não constitui corrupção. Mas elas sabem também que não é por isso
que Angola é considerada pelos Bancos, governos e organizações internacionais
como um dos países mais corruptos do mundo.
Elas
também sabem que «um estado de corrupção política desenfreada é conhecido
como uma cleptocracia, o que literalmente significa «governado por
ladrões». Isto se encontra em qualquer Dicionário.
Enquanto
Sua Excelência não vier a público afirmar como foi possível a certos indivíduos
ligados ao poder político fazer a acumulação primitiva de capital de dia para
noite, dificilmente os angolanos e o mundo o lembrarão como «um
patriota».
Não
se faz acumulação legítima de capital nem se criam grupos empresariais fortes
atravês do peculato, do nepotismo ou do clientelismo. Estes não são valores. São
crimes!
Vejam
apenas um exemplo:
Recentemente
a imprensa noticiou que o empresário António Mosquito assumiu o controle de
66,7% da Soares da Costa Construções, tendo pago cerca de 70 milhões de Euros.
Mas a questão que a Sociedade levanta è: este negócio é mesmo
dele?
Metade
da facturação da empresa portuguesa Soares da Costa vem de contratos em Angola
adjudicados pelo Estado angolano quase sem concurso.
E
quem é que adjudica ou manda ajudicar esses contratos?
Se
alguém compulsar os registos dessa transacção pública, irá verificar que o
comprador não é uma pessoa singular, mas sim uma empresa. A investigação poderá
provar ainda que a empresa utilizada no negócio, foi comprada antes por
pessoas próximas ao Presidente Eduardo dos Santos para servir de testa
de ferro na compra das acções da Soares da Costa.
Aliás,
esta tem sido a prática habitual da oligarquia chefiada pelo Presidente Eduardo
dos Santos. Usam vários testas de ferro, para esconder o facto de
que os donos reais destes negócios são os membros de umas poucas famílias que,
sob o comando do Presidente, não separam o trigo do joio, ou seja,
desviam o património da Nação para pertencer ao património pessoal dos
integrantes da oligarquia.
Se
a origem do dinheiro fosse legítima, porque colocar à frente o bom nome de um
cidadão, quando tudo parece indicar que quem comprou de facto a Soares da Costa
foi o grupo chefiado por José Eduardo dos Santos, o Presidente da Republica de
Angola?
Isto
é corrupção, senhor Presidente!
Não
há aqui nenhum preconceito dos europeus em relação aos africanos, Senhor
Presidente!
Ensina
Calil Simão que a corrupção política corresponde:
“ao
uso do poder público para proveito, promoção ou prestígio particular, ou em
benefício de um grupo ou classe, de forma que constitua violação da lei ou de
padrões de elevada conduta moral”
[1]
Na
Europa e na América, por exemplo, os cidadãos sabem quanto é que as grandes
companhias de petróleo, gás e minerais, pagam aos seus governos. Em Angola, o
Governo diz que isto é segredo e impede as companhias de divulgar esses dados.
Na
Europa e na América, por exemplo, combate-se a corrupção. Em Angola, a corrupção
política não é combatida. É defendida pelo Chefe de
Estado.
Os
europeus mencionam a corrupção dos políticos africanos, não porque os
invejam, mas porque os políticos africanos escolhem a Europa e a América
para guardarem e investirem os activos da corrupção. Compram empresas e imóveis
europeus, utilizando os Bancos europeus, os advogados europeus, os lobbies
europeus ou os sistemas de segredo americanos. Este é o verdadeiro estado da
Nação.
SOBRE A CRISE DE
VALORES E PRINCÍPIOS
Falar do estado da
Nação é, acima de tudo, avaliar o estado de espírito das pessoas, seus
princípios e valores, pois a Nação é uma entidade de direito
natural e histórico, anterior ao Estado.
Ela funda-se em
valores culturais, numa história comum, em atitudes e estilos de vida, em
maneiras de estar na natureza e no mundo, em instituições comuns, numa ideia de
futuro a cumprir que transcende no tempo e no espaço os números enganosos da
estatística e os limites do seu território original.
Não se pode falar
do estado da Nação angolana ainda em construção sem se referir à grave crise de
valores que ameaça tanto a sua digna inserção no mundo global como a sua
integridade e o seu futuro.
O
poder a todo o custo, a riqueza a qualquer preço, o prazer a todo o momento, são
falsos valores que enfermam a nossa Nação!
A
ostentação e o lucro fácil substituíram a integridade nos negócios e a virtude
do trabalho honesto. A mentira, a traição e a fraude substituiram a honradez, a
confiança e a seriedade nas relações sociais.
A
solidariedade está asfixiada. A virtude do amor ao próximo foi substituida pela
insensibilidade e pela endemia do amor ao dinheiro.
O
Senhor Presidente só se referiu à estiagem para justificar números. Mostrou-se
insensível ao sofrimento humano que ela encerra.
Ao
promover o medo, a intimidação, o enriquecimento ilícito, a violência moral, a
corrupção e a traição como valores supremos, o regime do Presidente José Eduardo
dos Santos agride os fundamentos morais e culturais da Nação angolana com o
objectivo de desintegrá-la na sua génese e, assim, subjugá-la aos seus
interesses e ambições pessoais.
Nesta
oportunidade em que nos encontramos, nas vêsperas do 38º aniversário da nossa
independência, a UNITA declara solenemente que rejeita estes falsos
valores e apela a todo o povo, em particular aos Deputados, Juízes,
académicos, jornalistas, autoridades tradicionais, comerciantes, líderes
religiosos e outros dignitários, para fazer o mesmo. Regeitemos todos estes
falsos valores.
A
UNITA reafirma por meu intermédio, a sua determinação de conduzir a Nação
angolana para uma mudança pacífica, mas profunda.
Uma mudança
construída sobre valores morais, sem nenhum sentimento de vingança. Mudança que
incluirá todos os nossos adversários, baseada na reconciliação, na
solidariedade, na justiça e na defesa intransigente da dignidade humana.
SOBRE
OS ANTIGOS COMBATENTES
O
senhor Presidente também está enganado quanto aos antigos combatentes. Afirmou
que mais de 159.000 antigos combatentes e veteranos de guerra beneficiam do
regime especial de protecção do Estado. Isto não corresponde à verdade,
porque uma boa parte dos beneficiários actuais não são antigos
combatentes nem veteranos de guerra.
São
pessoas que foram colocadas nas listas por favoritismo ou corrupção. Quantas
vezes as listas dos beneficiários foram refeitas! Muitos dos verdadeiros antigos
combatentes estão a passar mal. Fomos encontrar centenas deles no Cazombo, no
Lumbala Nguimbo, na Mavinga, no Cuimba, no N’zeto, no Tomboco, em Maquela do
Zombo, no Uíge e noutros lugares, incluindo Luanda.
Quer
sejam combatentes das ex-FAPLA, das ex-FALA ou do ELNA, Angola ainda não fez o
suficiente para honrar o sacrifício consentido por todos os seus
filhos.
SOBRE
O ESTADO DA JUSTIÇA
O
Presidente não mencionou o estado calamitoso em que se encontra a justiça
angolana.
O
Ministério Público demitiu-se das suas funções. Os juízes proferem sentenças por
encomenda. Os Tribunais Superiores sonegam a justiça, quer por sucumbirem ao
medo da ditadura, quer por não decidirem em prazo razoável e mediante processo
equitativo, tal como se observa nos dois Recursos que foram submetidos ao
Tribunal Supremo e ao Tribunal Constitucional, envolvendo actos praticados
pelo Presidente da República, que estão proibidos pela Constituição.
SOBRE
AS RELAÇÕES ANGOLA/PORTUGAL
Não
há crise alguma nas relações entre Angola e Portugal. Há sim uma crise de
valores em Angola, uma crise na justiça e nas instituições políticas angolanas
que se repercute lá onde os angolanos pretendem branquear o capital extorquido
do erário público.
Esta
crise de valores, como citou um político e académico de renome, faz alguns
angolanos pensarem que, cito, “‘o mundo deve girar à volta do seu umbigo”, só
porque exibem maços de dólares extraídos do erário público. Faz-lhes pensar que
a honra e a dignidade têm preço e que a justiça deve vergar-se aos interesses
privados de uma oligarquia, que os considera prosmícuamente de ‘interesse
público’.
A
UNITA considera ser no interesse superior de Portugal e de Angola que os
processos judiciais envolvendo actos privados, não soberanos, de governantes
angolanos, não sejam arquivados. As investigações devem continuar para que se
apurem os factos e se realize a justiça.
Acreditamos
ser também no interesse do próprio senhor Presidente da República de Angola e
demais entidades visadas, que as investigações cheguem ao fim, porque só assim,
o bom nome das entidades angolanas visadas, ficará limpo.
Estamos
interessados em ver vindicados o bom nome do nosso Presidente, do
Vice-Presidente e seus Ministros, quer na justiça angolana – onde também
decorrem processos de corrupção - quer na justiça portuguesa.
A
UNITA considera que as relações entre Portugal e Angola são perenes e não se
deterioram com um discurso, com as declarações de um Ministro, nem com a postura
de um Governo ou mesmo de um Presidente que surja deste ou daquele lado da costa
atlântica.
O
passado, o presente e o futuro de Angola e de Portugal continuarão ligados por
muitos séculos. Aproxima-se rapidamente o dia em que Angola será uma democracia
madura. Também se aproxima o dia em que Portugal terá em Angola os
interlocutores certos para a construção de uma parceria certa. Quando as duas
coisas acontecerem, os dois Estados terão as parcerias que os seus povos
merecem.
Como
alguém afirmou recentemente, cito, “bem ou mal, Portugal, pobre, falido e com
muitos problemas, continua na lista da honradez e da seriedade, muitos
lugares acima do corrupto regime de Luanda (33º no ranking da Transparency
International, contra 157º de Angola)”.
Se
Portugal tiver a coragem de se apegar sempre aos grandes princípios, terá a
moral suficiente para lidar com qualquer ditadura que tentar minar a perenidade
das suas relações com Angola.
A
UNITA encoraja o povo português, em particular os empresários, os jovens
empreendedores, os reformados e também a classe política a pautar a sua conduta
para com Angola com base nos princípios da legalidade, do estado de direito, da
transparência, da separação de poderes e da probidade
pública.
Prezados
compatriotas:
A Nação angolana
está gravemente doente e todos queremos mudar esta situação. O regime do
Presidente Eduardo dos Santos, persiste em não mudar.
Muda a
constituição, mudam os nomes da oligarquia partidária, mas nem o Presidente
concebido como monarca absoluto muda, nem tampouco a deliberada e intencional
confusão entre o patrimônio da nação e o patrimônio privado dos integrantes da
oligarquia.
É nossa convicção
que o sucesso de Angola como nação, depende da nossa coragem e patriotismo para
repudiarmos A CULTURA DOS FALSOS VALORES, erradicarmos juntos o ESTIGMA DA
EXCLUSÃO, e reencontrarmo-nos, como irmãos, na construção de uma
autêntica democracia, de uma sociedade aberta e pluralista, que promova o
desenvolvimento, a justiça social e a solidariedade nacional.
Desta tribuna, nas
vésperas do 38º aniversário da nossa independência, a UNITA reafirma, por meu
intermédio, para todo o povo angolano, o seu compromisso irreversível e
incondicional com a reconciliação nacional.
Paz, reconciliação
nacional e democracia, são objectivos nacionais permanentes, com os quais
estamos comprometidos.
Para alcançarmos
estes grandes objectivos nacionais, é imperativo que, como Nação, concordemos
todos em dois aspectos:
Primeiro: o estado
da Nação apresentado pelo Senhor Presidente da República, está distorcido,
porque não reflecte a realidade.
Segundo: precisamos
de identificar as causas reais do estado actual da Nação e encontrar uma saída
para que Angola resgate os seus valores e sobreviva ao regime de quem a quer
subjugar, o seu actual Presidente!
SÍNTESE DO ESTADO
DA NAÇÃO
A Nação angolana
está mutilada e gravemente doente, porque os seus fundamentos foram atacados por
quem os devia proteger. A paz foi revogada, a liberdade foi sufocada, os valores
foram pisoteados, a democracia foi deformada e a exclusão está sendo
aprofundada.
O petróleo não está
a financiar a diversificação da economia nem a constituição dum estruturante
capital humano nacional. O regime transformou Angola num país
povoado por uma população pobre que é subjugada por uma das elites
mais ricas e insensíveis do mundo.
Os angolanos querem
mudança, mas o regime continua fixado no passado, esticando a crise social e
institucional ao limite da ruptura, na sua tentativa de subjugar Angola e
comandar o futuro. A intensidade do conflito entre estes dois polos - o do
regime e o de Angola -, cresceu de tal forma que um terá de sobreviver ao
outro.
Esta é, do nosso
ponto de vista, a síntese do estado real da Nação!
Muito
obrigado.