Presidência da República: O Epicentro de Corrupção em
Angola
Introdução
O presente relatório revela o modo como a Presidência da
República de Angola tem sido usada como um cartel de negócios obscuros e as
consequências dessa prática para a liberdade e o desenvolvimento dos cidadãos
assim como para a estabilidade política e económica do país. O texto responde
aos apelos da política de tolerância zero contra a corrupção decretada pelo
Presidente José Eduardo dos Santos, a 21 de Novembro de 2009.
Por uma questão de clareza, a investigação cinge-se a uma pequena amostra das práticas comerciais empreendidas pelo ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República, o general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”. A este cabe a coordenação dos sectores de defesa e segurança do país. Com este dirigente, o chefe de Comunicações da Presidência da República, general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, e o presidente do Conselho de Administração e director-geral da Sonangol, Manuel Vicente, formam o triumvirato que hoje domina a economia política de Angola, sem distinção entre o público e o privado. Manuel Vicente junta ainda, aos poderes acumulados pelos generais e a Sonangol, o facto de ser um dos membros mais influentes do Bureau Político do MPLA, como delfim do presidente e responsável pela fiscalização dos negócios particulares do partido no poder. A petrolífera nacional é a maior empresa do país e o maior contribuinte das receitas do Estado. Vários analistas têm considerado a Sonangol como o principal instrumento da manutenção do regime de José Eduardo dos Santos nos domínios financeiro, político e diplomático, assim como é a principal fonte de enriquecimento ilícito dos seus principais dirigentes. Em alguns casos são referidas as relações solidárias e de cumplicidade com outros membros do executivo e gestores públicos na realização de negócios que envolvem a pilhagem do património do Estado e outras acções de contravenção às leis da república. Sectores estratégicos como o dos petróleos, telecomunicações, banca, comunicação social e diamantes, fazem parte do império construído por tais figuras. A amostra refere-se às empresas Movicel, Biocom, Banco Espírito Santo Angola, Nazaki Oil & Gás, Media Nova, World Wide Capital e Lumanhe. A Lei da Probidade Pública é usada amiúde, para melhor compreensão do leitor, mesmo para os casos que antecedem à sua aprovação, em Março passado, por ser uma compilação de diversos diplomas legais contra a corrupção, que datam desde 1989.2 Todos os artigos constantes na Lei da Probidade Pública se encontravam dispersos em tais diplomas. Por exemplo, a Lei dos Crimes Cometidos por Titulares de Cargos de Responsabilidade (Lei nº 21/90, não revogada pela Lei da Probidade Pública) proíbe o dirigente de participação económica em negócio sobre o qual tenha poder de influência ou decisão (art. 10º, 2). Movicel Actualmente existem apenas duas operadoras de telefonia móvel no país, a Unitel e a Movicel. A Unitel, a operar desde 2001, resulta da sociedade, por quotas iguais (25%), entre a Sonangol, através da sua subsidiária MSTelcom (ex-Mercury), a Portugal Telecom, GENI e Vidatel. A Movicel foi criada pelo governo, em 2003, como uma subsidiária da empresa telefónica estatal Angola-Telecom. No ano passado, através da Resolução n° 67/09 de 26 de Agosto, o Conselho de Ministros determinou a privatização expedita e sem concurso público da Movicel, a um consórcio de empresas angolanas, pelo valor 200 milhões de dólares. Para o efeito, o órgão do governo, invocou a dificuldade na mobilização de outros investidores para a privatização da companhia. Argumentou, também, sobre a urgência em gerar fundos para os cofres do governo “face à crise financeira mundial”. Essa decisão, segundo a referida resolução governamental, teve em conta a identificação de “uma estrutura do empresariado nacional, que assegura os recursos financeiros vitais para a aplicação imediata do plano de investimentos da Movicel e o encaixe financeiro esperado para o tesouro nacional”. No entanto, 59% do capital da Movicel foi transferido para duas empresas afectas a altas patentes subordinadas ao ministro de Estado e chefe da Casa Militar, general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, a Portmill e a Modus Comunicare, conforme se descreverá. A 10 de Junho de 2009, o general Kopelipa, o general Dino e Manuel Vicente, apartaram-se formalmente da sociedade Portmill Investimentos e Telecomunicações de que eram proprietários, com 99,96% das acções equitativamente repartidas entre si. Cederam as suas quotas, por intermédio do português Ismênio Coelho Macedo, a um grupo de altos oficiais da Unidade de Guarda Presidencial (UGP), conforme tabela abaixo descrita. No caso da Portmill, o tenente-coronel Leonardo Lidinikeni, oficial da escolta presidencial, detém 99,96% das acções da empresa. Na Modus Comunicare, o tenente-coronel Tadeu Agostinho dos Santos Hikatala, responsável da escolta presidencial, é o titular de 99,92% das acções. A UGP está subordinada à Casa Militar. Coube também ao gestor dos negócios privados do general Kopelipa, Ismênio Coelho Macedo, a operação de compra e reestruturação de uma pequena empresa de comunicação, publicidade e marketing, a Modus Comunicare – Comunicação e Imagem Lda., que não tinha expressão no mercado, colocando na sua estrutura accionista altas patentes do palácio presidencial. A empresa foi transformada em sociedade anónima, dedicada às telecomunicações, a 14 de Agosto de 2009. Essa data indica que o processo de reconhecimento legal da transacção, a sua transformação em sociedade anónima e alteração do objecto social apenas ficou concluído duas semanas após o governo, dirigido pelo Presidente José Eduardo dos Santos, ter atribuído 19% do capital da Movicel a esta empresa. A 29 de Julho de 2009, o Conselho de Ministros aprovou a privatização de 80% do capital da Movicel a favor das empresas angolanas Portmill Investimentos e Telecomunicações (40%), Modus Comunicare (19%), Ipang – Indústria de Papel e Derivados (10%), Lambda (6%) e Novatel (5%). Por sua vez, as empresas estatais Angola Telecom e a Empresa Nacional de Correios e Telégrafos de Angola detêm respectivamente 18% e 2% do capital social da Movicel. A seguir apresenta-se uma tabela das empresas beneficiárias e seus accionistas: Portmill, Investimentos e Telecomunicações (40%) Sócio e Função Tenente-coronel Leonardo Lidinikeni Oficial de Escolta Presidencial, Unidade de Guarda Presidencial Francisco Ndeufeta Manuel dos Santos Rodrigues Cardoso Nelson Paulo António Tenente-coronel Francisco Mbava Acção Psicológica, Casa Militar Modus Comunicare - Telecomunicações (19%) Sócio e Função Tenente-coronel Tadeu Agostinho dos Santos Hikatala Oficial de Escolta Presidencial, Unidade de Guarda Presidencial João Ricardo Belarmino Tenente-coronel João José António Soares Conselheiro do chefe da Unidade de Guarda Presidencial, General Alfredo Tyaunda José Kakonda José Luís Alves Ipang – Indústria de Papel e Derivados, Limitada (10%) Accionistas N’datembu – Comércio Geral, Importação e Exportação Ltda. A Ipang é a única empresa beneficiária que apresenta, na sua estrutura accionista formal, empresários. A N’datembu tem entre os seus accionistas Miguel Domingos Martins e filhos, o advogado Ildeberto Manuel Teixeira e o português José Mamade Etbal. Outro nome associado à Ipang é o do empresário espanhol Óscar Ouersagasti Soraluce. De qualquer modo, a entrada no capital da Movicel é a única actividade empresarial publicamente conhecida da Ipang. Mais informações sobre este grupo e outros eventuais investidores serão actualizadas oportunamente. Lambda (6%) Sócio e Função José Carvalho da Rocha Ministro das Telecomunicações e Tecnologias de Informação Aristides Safeca Vice-ministro das Telecomunicações e Tecnologias de Informação Zulmira Mitange da Rocha Esposa do ministro José Carvalho da Rocha Arminda Vireya Safeca de Sá Parente do vice-ministro Aristides Safeca Antónia Dias dos Santos Caxinda Enquanto director nacional das Telecomunicações, Aristides Cardoso Frederico Safeca integrou a Comissão de Negociação da Movicel, em cumprimento do Despacho n° 67/07 do ministro das Finanças José Pedro de Morais, datado de 19 de Janeiro de 2007. Essa comissão era chefiada pelo então assessor económico do Presidente José Eduardo dos Santos, Archer Mangueira. Desde 2 de Outubro de 2006, Aristides Safeca exerce as funções de presidente do Conselho de Administração e director da empresa belga Parisa, S.A. O mesmo Aristides Safeca, em sociedade com os seus irmãos Alcides Safeca, secretário de Estado do Orçamento (Ministério das Finanças) e Amílcar Safeca, director da UNITEL, são os sócios maioritários da Trans Omnia, na qual se associam ao general Fernando Vasquez Araújo, chefe da Direcção Principal de Armamento e Técnica do Estado Maior General das FAA. A Trans Omnia tem sido privilegiada com contratos multimilionários para o abastecimento de bens alimentares às FAA, um assunto a ser abordado à parte. Apesar da nova Lei da Probidade, Aristides Safeca continua, de forma impune, a acumular funções públicas com cargos privados. O vice-ministro para as Telecomunicações mantém-se como presidente do Conselho de Administração e director de uma empresa estrangeira, a Parisa (com sede na Bélgica), e a realizar múltiplos negócios com o Estado para seu enriquecimento, de familiares e seus associados. Novatel (5%) Sócio e Função Hélder Bruno da Gama Bento Paula Sammer Pinto Jorge Aurélio Vimbuando Muelecumbi Onezandro Catinhe Mauro Santos Piedade Marília da Conceição dos Santos Kissuá A atribuição de uma quota à Novatel, na privatização da Movicel, é mais uma prova de desvio do património público em prejuízo do Estado. A Novatel foi criada a 29 de Abril de 2009, após apresentação do parecer da Comissão de Negociação da Movicel e três meses antes do anúncio formal das empresas beneficiárias, pelo Conselho de Ministros. À data da privatização formal da Movicel, os sócios da Novatel, acima descritos, não apresentavam individual ou solidariamente quaisquer investimentos que os identificassem como empresários. Apesar das objecções de uma das figuras citadas em assumir a sua participação no negócio, devido à existência de expedientes jurídicos para encobrir os verdadeiros accionistas, as acções da Novatel são nominativas. Tal como os estatutos obrigam (art. 5, 1), as acções têm titulares precisos e determinados, conforme a lista acima descrita. Para todos os efeitos, são formalmente responsáveis pelos deveres e obrigações decorrentes da titularidade das acções, sendo portanto os titulares das mesmas accionistas formais. Anotações sobre a Movicel Os nomes revelados nas estruturas accionistas das empresas a favor das quais o Conselho de Ministros privatizou a Movicel revelam, de forma clara, a mentira do governo sobre o assunto. Não se trata de um negócio sedimentado numa estrutura do empresariado nacional e muito menos de grupos com recursos financeiros para contribuir para o tesouro nacional face “à crise financeira mundial”, conforme argumento oficial acima referido. A urgência a que o governo aludia para gerar fundos para os cofres do Estado também é um engodo, pois não há qualquer confirmação oficial e pública do pagamento dos 200 milhões de dólares ao Estado, como é regra. Por outro lado, vários economistas estimam que a Movicel, mesmo na venda a saldos, vale vezes mais do que o valor estabelecido pelo governo. Trata-se de um expediente de alienação do património do Estado a favor de desígnios privados geridos pelo chefe da Casa Militar do Presidente da República em cumplicidade com outros órgãos de influência junto da presidência e dos titulares do Ministério das Telecomunicações e Tecnologias de Informação acima mencionados. Os membros do governo e altos oficiais da Presidência da República incorrem, de acordo com a Lei da Probidade Pública, em diversas ilegalidades. O princípio da probidade pública impede o agente público, para o caso, de aceitar empréstimos, facilidades ou ofertas que possam afectar “a independência do seu juízo e a credibilidade e autoridade da administração pública, dos seus órgãos e serviços”. A privatização da Movicel revela-se, sem escrúpulos, numa benesse concedida pelo chefe do governo, o Presidente José Eduardo dos Santos, aos seus subordinados. Um jurista, que preferiu escrever sob o anonimato, descreve a privatização da Movicel como um “acto administrativo que padece do vício de desvio de poder por motivo de interesse privado”. Segundo o jurista, esse desvio ocorre “quando a administração não prossegue um fim de interesse público, mas um fim de interesse privado - por razões de parentesco, de amizade (…), por motivos de corrupção, ou quaisquer outros de natureza particular”. Enquanto empresa pública, a Movicel era uma das empresas mais rentáveis e mais bem organizadas do Estado, com mais de 2.5 milhões de clientes. A privatização da Movicel não contribui para a sua maior eficiência ou em mais receitas para os cofres do Estado. Todavia, o acto desencoraja a competitividade do mercado e o empresariado nacional por reforçar o controlo do sector privado por parte dos governantes que assumem a dupla função de empresários, através da pilhagem do património público. O jurista acima referido considera, logo à partida e muito bem, sobre a nulidade da privatização da Movicel, que “a falta de concurso público, quando legalmente exigível, torna nulo o procedimento e o subsequente contrato, por preterição de um elemento essencial (Artigos 76º, nº 2, alínea f) e 127º do Decreto-Lei nº 16-A/95, de 15 de Dezembro)”. O argumento do jurista é o seguinte: “Estatui o Artigo 77º do mesmo diploma legal que: 1. O acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade. 2. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal”. Outrossim, os agentes públicos, acima descritos como beneficiários da privatização da Movicel, cometem um acto conducente ao enriquecimento ilícito de acordo com a Lei da Probidade Pública (art. 25º, a) por recebimento de percentagem num negócio privado com o Estado. Os mesmos agentes cometem ainda actos lesivos ao património público, segundo a Lei da Probidade Pública (art. 26º, 2, a) por integrarem, no seu património particular, uma empresa pública. Outra questão grave, na privatização da Movicel, tem a ver com a natureza do regime que depende, de modo extremo, dos serviços de segurança ao contrário dos preceitos do Estado de direito. As telecomunições são uma área muito sensível para os serviços de inteligência e fundamentais no processo de vigia e controlo das relações entre os cidadãos. O controlo privado das duas operadoras de telemóveis no país, por parte do círculo presidencial, reforça o poder privado e caprichoso de controlar, através de escutas arbitrárias e outros mecanismos malsãs, a liberdade de expressão dos cidadãos. O general Leopoldino Fragoso do Nascimento, chefe de comunicações da presidência, é accionista da Unitel, através da Geni, que detém 25% do capital da operadora. Banco Espírito Santo Angola A 10 de Dezembro de 2009, a empresa Portmill, Investimentos e Telecomunicações (vide tabela acima), com oficiais afectos à Casa Militar da Presidência da República à testa, realizou a compra de 24% das acções do Banco Espírito Santo Angola (BESA) por 375 milhões de dólares.4 O Banco Espírito Santo (Portugal) mantém a sua posição como accionista maioritário, com 51,94% do capital social. No entanto, o Banco Espírito Santo tem evitado pronunciar-se sobre a sua relação com os accionistas da Portmill, escusando-se a responder às questões submetidas pelo jornal português Público sobre o assunto. A 19 de Julho, após conversa telefónica, o autor endereçou ao gabinete de imprensa do BES as seguintes questões: “Como pode o BES ter concretizado um negócio de 375 milhões de dólares com um grupo de oficiais militares no activo? Não questionou a proveniência dos fundos para o negócio e a licitude do acto?” O gabinete de comunicação do BES respondeu que as questões devem ser remetidas ao BESA, como instituição autónoma. Todavia, o autor insistiu junto da mesma entidade, sem sucesso, em perguntar porque o titular das acções vendidas à Portmill Investimentos e Telecomunicações foi o BES. Esse negócio levanta duas questões pertinentes. Primeiro, sobre a origem dos fundos que os militares no activo, como legítimos proprietários da empresa, desembolsaram para a realização do negócio. Segundo, coloca o banco português, liderado por Ricardo Salgado, numa potencial situação de branqueamento de capitais adquiridos de forma ilícita, porventura pilhados ao Estado angolano. Os oficiais da Casa Militar e da Unidade de Guarda Presidencial têm duas vias para a realização de capital, por posse de património ou por recurso a empréstimo bancário. Do ponto de vista legal estas duas opções alertam para os limites materiais estabelecidos por lei. O agente público está proibido de solicitar ou aceitar empréstimos “que possam pôr em causa a liberdade da sua acção, a independência do seu juízo e a credibilidade e autoridade da administração pública, dos seus órgãos e serviços” (Lei da Probidade Pública, art. 5º). A sociedade angolana desconhece que os novos parceiros do Banco Espírito Santo sejam herdeiros de fortunas familiares ou alguma vez tenham seguido uma carreira privada, como fonte de riqueza pessoal. Excluída a possibilidade de posse de património lícito na ordem das centenas de milhões de dólares, resta a possibilidade de empréstimo. Conforme a lei acima referida, a concessão de um empréstimo bancário avultado a oficiais superiores do exército angolano, com a tarefa de garantir a protecção física do Presidente da República e da presidência em geral, levanta sérias questões de segurança nacional e física do mais alto magistrado da nação. Essa questão merecerá comentários adicionais no capítulo referente às conclusões. Por outro lado, a Lei da Probidade Pública estabelece como acto de enriquecimento ilícito (art. 25º, g) “adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do património ou à renda do agente público”. Nem o Banco Espírito Santo, uma entidade idónea e de reputação internacional nem a Casa Militar do Presidente da República estão em condições de explicar a proporcionalidade dos vencimentos dos oficiais das Forças Armadas Angolanas, em questão, com a grandeza da parceria assinada. Todavia, o chefe da Casa Militar e ministro de Estado, general Kopelipa, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento, seu principal colaborador, e Manuel Vicente devem responder publicamente sobre a transacção das acções da Portmill. Por que razão, enquanto proprietários, transferiram a titularidade da Portmill a membros da Guarda Presidencial? Nessa operação, é notável o papel executor de Ismênio Coelho Macedo, que também exerce a função de administrador do Banco Privado Atlântico (BPA), uma instituição privada da qual a Sonangol detém 19.50% do capital social. Até ao ano 2000, Ismênio Coelho Macedo dirigia, em Angola, o Banco Português do Atlântico (BPA). Importa, no entanto, referir que a promiscuidade entre o dever público e os interesses privados é uma prática aperfeiçoada na Presidência da República envolvendo a família presidencial. Por exemplo, em 2004, o Presidente José Eduardo dos Santos achou bem a criação da sociedade de gestão de negócios Luzy, entre a sua filha Tchizé dos Santos, o chefe da Unidade de Guarda Presidencial, general Alfredo Tyaunda, e o então assessor do presidente, general Clemente Cunjuca. Este último exerce actualmente as funções de vice-ministro dos Veteranos de Guerra. Do mesmo modo, a 30 de Maio de 2001, os generais Kopelipa, Alfredo Tyaunda e Clemente Cunjuca formaram uma sociedade de negócios, a Lunha Imobiliária, com o então chefe da Casa Civil do Presidente da República, José Leitão. Os referidos altos funcionários da presidência consolidaram a estrutura accionista da Lunha com a participação do tio (padrinho) e sobrinho de José Eduardo dos Santos, respectivamente José Pereira dos Santos Van-Dúnem e Catarino Avelino dos Santos. Em 2002, essa empresa juntou-se a quatro offshores, nomeadamente, Valuta Investimentos, Landon Holdings, Oakleigh Holdings e Osmond Investimentos, na criação da Lunha Investimentos. Esta, por sua vez, ergueu recentemente, no terreno ligado à Casa Militar, no Morro Bento, um condomínio exclusivo com 58 vivendas de luxo, onde os preços por unidade chegam a atingir os quatro milhões de dólares. Biocom – Companhia de Bioenergia de Angola, Limitada O Conselho de Ministros aprovou, a 24 de Julho de 2009, o projecto Unidade Agro-Industrial de Cacuso - Malanje para o cultivo e produção de cana de açúcar. Orçado em 272.3 milhões de dólares, o projecto visa a produção de açúcar, álcool e energia eléctrica. Para o efeito, a 25 de Outubro de 2007, a multinacional brasileira Odebrecht, a empresa privada angolana Damer Indústria S.A e a Sonangol Holdings constituiram a Companhia de Bionergia de Angola (Biocom). As duas primeiras detêm 40% do capital social da empresa proprietária da Unidade Agro-Industrial de Cacuso, ao passo que a petrolífera nacional fica com 20% das acções. A Odebrecht predispos-se a responder às questões sobre a sua participação na Biocom, mas não pode fazê-lo a tempo devido às férias do seu responsável para os biocombustíveis. Como é corrente nos investimentos de vulto aprovados pelo Conselho de Ministros e nas parcerias entre multinacionais estrangeiras e empresas privadas angolanas, parte considerável do capital social é reservada a dirigentes. A Damer Indústria S.A, criada a 26 de Julho de 2007, pertence, de forma equitativa aos generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento em associação a Manuel Vicente, presidente e director-geral do Conselho de Administração da Sonangol. No documento de aprovação do projecto oficializado como Resolução nº 63/09 de 18 de Agosto, o Conselho de Ministros reiteirou que o mesmo cumpre com o desiderato, entre outros, de fomento do empresariado angolano. A Damer foi criada três meses antes de se estabelecer a Biocom e os seus proprietários não são empresários, mas agentes públicos. A Lei da Probidade Pública considera agente público, “a pessoa que exerce mandato, cargo, emprego ou função em entidade pública, em virtude de eleição, de nomeação, de contratação (…). De forma específica a lei enquadra os membros da administração central (artº 2, d), os gestores de património público afectos às Forças Armadas Angolanas (artº 2, h) e os gestores de empresas públicas (ibid., i) como agentes públicos”. Assim, o projecto padece de vários vícios de corrupção. Primeiro, a multinacional Odebrecht incorre no acto de tráfico de influência e corrupção de dirigentes angolanos. A definição e criminalização de actos de suborno e corrupção de agentes públicos consta dos artigos 318º a 323º do Código Penal, para os quais a Lei dos Crimes contra a Economia (Lei nº 13/03) remete juízo. Por sua vez, as convenções da União Africana (Artigo 4º, 1, f) e das Nações Unidas contra a Corrupção (Artigo 18º, a, b), assim como o Protocolo da SADC contra a Corrupção (Artigo 3º, 1, f) definem com clareza, e de forma similar, o tráfico de influência como um acto de corrupção. Esses tratados foram incorporados no direito angolano é-lhes aplicada moldura penal através do Artigo 321º do Código Penal angolano. O presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente, engaja a subsidiária Sonangol Holdings e fundos públicos no negócio da Biocom, no qual é sócio privado, num acto contrário à lei. Ademais, de acordo com o semanário O País6, o Banco Africano de Investimentos (BAI) lidera um sindicato para a concessão de financiamento ao projecto, no valor de 168 milhões de dólares. O BAI é um banco privado cujo maior accionista é uma entidade pública, a Sonangol, e tem como seu vice-presidente Manuel Vicente. Numa promiscuidade vertiginosa, Manuel Vicente também é sócio privado do BAI, com 5% das acções, através da sua empresa offshore ABL.7 Ao usar a sua posição de gestor da Sonangol na obtenção de 5% do capital social do BAI, para enriquecimento pessoal, Manuel Vicente incorre também em actos de corrupção previstos no Código Penal (art. 321º). O negócio engaja a pessoa do Presidente José Eduardo dos Santos. Durante a sua visita ao Brasil, de 22 a 25 de Junho de 2010, o chefe de Estado encontrou-se com com o presidente da Odebrech, Marcelo Odebrecht, com quem abordou o projecto Biocom e a vontade desta multinacional em expandir os seus investimentos no país. No seu discurso oficial, durante o encontro com o presidente Lula da Silva, José Eduardo dos Santos pediu o apoio do Brasil (…) para os “projectos que visam criar fontes alternativas de energia, tanto a solar como a de biocombustíveis, para as quais a já significativa experiência brasileira nesses domínios poder ser de grande ajuda”. Essa preocupação presidencial para um negócio poluído pela corrupção, dos generais mais próximos de si e sobre quem repousa a segurança do seu poder, coloca-o na dúbia posição de patrocinador de tais actos ou de refém dos mesmos. Nazaki Oil Através dos Decretos-Lei nº 14/09 e nº 15/09 de 11 de Junho de 2009, o Conselho de Ministros concedeu à Sonangol, como concessionária nacional, “os direitos mineiros de prospecção, pesquisa, desenvolvimento e produção de hidrocarbonetos líquidos e gasosos (…)” dos blocos 21 e 9 em águas profundas, respectivamente. Essa decisão conforma a Lei n° 10/04 (art. nº 44, 2), segundo a qual todos os direitos acima referidos serão concedidos pelo Estado à Sonangol. Para o efeito, o governo ratificou o consórcio estabelecido entre a Sonangol, a empresa privada angolana Nazaki Oil & Gás e a empresa americana Cobalt International Energy, sendo a última designada como operadora dos Blocos 9 e 21. A Cobalt International Energy, tem como fundadores e principais accionistas o Goldman Sachs, e a sociedade entre o Grupo Carlyle e a Riverstone Holdings, com um investimento inicial, em 2005, de 500 milhões de dólares.De certo modo, estes dois últimos sócios investem, também, no negócio, fundos públicos angolanos. A Sonangol tem investidos nos fundos de energia do Grupo Carlyle/ Riverstone Holdings cerca de 500 milhões de dólares. A Cobalt, de acordo com a Global Witness, recusou-se a identificar os proprietários da Alper Oil e da Nazaki argumentando que o acto “envolveria a revelação selectiva de informação restrita sobre a compania e, em alguns casos, fazê-lo seria uma violação das cláusulas de confidencialidade a que *a Cobalt+ está sujeita”. Este argumento é falacioso porquanto a legislação angolana não prevê a protecção de actos de corrupção mediante confidencialidade quer mediante outros quaisquer mecanismos jurídicos, pois a corrupção está bem definida como acto ilícito e de natureza criminal. Todavia, a Cobalt sustenta, junto das autoridades americanas, que “nós não trabalhámos com nenhuma destas companhias no passado e, por conseguinte, a nossa familiaridade com essas empresas é limitada. Violações da FCPA (Lei das Práticas Corruptas no Estrangeiro) podem resultar em duras sanções criminais ou civis, e podemos estar sujeitos a outros procedimentos, que afectariam negativamente o nosso negócio, os resultados operacionais e a condição financeira”. Os principais executivos da Cobalt, incluindo o seu director-geral Joseph Bryant, têm vasta experiência de trabalho em Angola, como gestores da British Petroleum no país, e o argumento que apresentam revela uma fraca justificação perante as leis americanas e desprezo pela legislação angolana, como adiante se demonstra. Para conhecimento público, a Nazaki Oil & Gás tem como proprietários, com quotas iguais, o chefe da Casa Militar do Presidente da República e ministro de Estado, general Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, o chefe de Comunicações do Presidente da República, general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, e o patrão da Sonangol, Manuel Vicente. Quatro subordinados do general Kopelipa são usados como testas-de-ferro da empresa, possuindo cada 0,01% das acções da Nazaki. Estes são o coronel José Manuel Domingos “Tunecas”, seu director de gabinete, coronel João Manuel Inglês, logístico, coronel Belchior Inocêncio Chilembo, conselheiro. O quarto beneficiário, Domingos Manuel Inglês, é o assistente privado do general, nos seus negócios. Esta empresa tem ainda três outras subsidiárias, respectivamente a Nazaki Distribuição – Sociedade de Distribuição de Combustível e Lubrificantes SA, Nazaki Refinaria – Sociedade de Refinação e Petróleo SA, e a Nazaki Petroquímica – Sociedade Petroquímica SA, criadas a 23 de Julho de 2008. A 24 de Fevereiro de 2010, a Cobalt International Energy assinou os Acordos de Risco (Risk Services Agreements), para as operações de exploração, pesquisa e produção nos Blocos 9 e 21 offshore. Os acordos foram assinados com a Sonangol, a Sonangol Pesquisa e Produção, a Nazaki Oil & Gás S.A e mais uma empresa privada angolana, inicialmente não prevista na autorização do governo, a Alper Oil. Para os Blocos 9 e 21, a estrutura accionista é a mesma: Cobalt (40%), Nazaki (30%), Sonangol Pesquisa & Produção (20%) e Alper Oil (10%). Segundo a Cobalt, esta “obteve a aprovação escrita da Sonangol, datada de 3 de Março de 2010, para os gastos realizados nos trabalhos técnicos dos Blocos 9 e 21 em offshore, como despesas prévias dos Acordos de Risco, para futuras deduções em impostos. Como resultado, a Nazaki reembolsará a companhia pelas suas obrigações financeiras no bónus de concessão e custos relacionados com estudos sísmicos nos referidos blocos.” A Cobalt pagou, à Sonangol, os 3.7 milhões de dólares do bónus de assinatura devidos pela Nazaki (art. 21º, 1, do contrato para o Bloco 21) e 1.5 milhões de dólares (art. 21º, 1, do contrato para o Bloco 9). Como pode uma empresa americana listada na bolsa de Valores de Nova Iorque (New York Stock Exchange) e que emprega duas reputadas firmas de advogados, justificar pagamentos em nome de uma empresa privada (Nazaki) do círculo mais restrito do presidente angolano, mesmo a título de reembolso? A atribuição dos Blocos 9 e 21 ao consórcio liderado pela Cobalt, sem concurso público, revela, também, o pleno conhecimento dos verdadeiros beneficiários do negócio por parte do então primeiro-ministro e actual presidente da Assembleia Nacional, Paulo Kassoma, que ratificou a decisão, e do Presidente José Eduardo dos Santos, que a promulgou. Do ponto de vista legal, as mais altas figuras do país patrocinam um acto eivado de corrupção. A legislação angolana, como tem sido demonstrado, proíbe os dirigentes e gestores públicos de realizar negócios com o Estado para benefício e enriquecimento pessoal. Por sua vez, a Cobalt, tal como o Banco Espírito Santo e a Odebrecht, incorre também em actos criminais. A sua acção pode ser descrita como um acto de tráfico de influências de dirigentes angolanos, de acordo com as convenções da União Africana (Artigo 4º, 1, f) e das Nações Unidas contra a Corrupção (Artigo 18º, a, b), assim como o Protocolo da SADC contra a Corrupção (Artigo 3º, 1, f) que, de forma similar, definem o tráfico de influência como um acto de corrupção. Esses tratados foram incorporados no direito angolano e se lhes é aplicada moldura penal através do Artigo 321º do Código Penal angolano para o acto em questão. Como exemplo, a Cobalt esteve envolvida em negociações com o presidente do Conselho de Administração e director-geral da Sonangol, Manuel Vicente, enquanto representante do Estado. A parceria com a Nazaki, de Manuel Vicente e os generais Dino e Kopelipa, este último a sombra do presidente, configura não só tráfico de influência como também um acto de corrupção activa de dirigentes, de acordo com o Código Penal angolano (art. 321º). A falta de transparência em Angola, e no sector petrolífero em particular, tem sido alvo de alguma atenção internacional por parte de governos e ONGs ocidentais. Uma das instituições que teve maior ousadia em obter do governo um compromisso para um maior escrutínio do sector petrolífero, foi a Soros Foundation e Open Society Institute do bilionário e filantropo americano George Soros. Após vários meses de negociações, a 13 de Novembro de 2003, Soros esteve em vias de assinar, na embaixada de Angola em Washington DC, um acordo com a Sonangol e o governo angolano, para garantir a transparência na governação e, em particular, no sector petrolífero. Passados sete anos, George Soros aparece como accionista de referência da Cobalt, através da Soros Fund Management, que detém 5.9 milhões de acções na petrolífera americana, avaliadas em 81.1 milhões de dólares. O escritório de Soros manifestou a sua indisponibilidade, por motivos de viagem, em comentar sobre a sua participação no negócio. O acordo de transparência de Soros, de cuja assinatura o governo desistiu à última hora, previa assistência técnica e financeira às autoridades angolanas e à Sonangol para a implementação de reformas afins. Incluía também acções no sentido de melhorar a imagem do governo e da Sonangol, no exterior, para maior acesso aos mercados internacionais de capital entre outras vantagens aliciantes. Nos últimos sete anos, membros do regime, e por consequência os gestores da Sonangol, têm tornado cada vez mais patente os seus actos de corrupção e de pilhagem do património do Estado, causando maior empobrecimento e desnorte à maioria dos angolanos. O exemplo de Soros revela, entre muitos outros, como os grandes poderes internacionais, quer ao nível de países quer ao nível de instituições internacionais se renderam aos encantos do petróleo e da corrupção em Angola. Soros é também um dos principais impulsionadores de iniciativas internacionais como a Publish What you Pay, Revenue Watch Institute, Extractive Industries Transparency Initiative, que obrigam os governos corruptos dos países mais fracos a ser mais transparentes. Media Nova A 14 de Dezembro de 2008, a TV Zimbo iniciou, de forma polémica, as suas emissões como o primeiro canal privado de televisão em Angola sem que haja, até à data, regulamento legal necessário. A Lei de Imprensa estabelece (art. 59º) que o “exercício da actividade de televisão está sujeito a licenciamento prévio mediante concessão outorgada através de concurso público, no quando do Plano Nacional de Televisão e obedece aos preceitos da legislação angolana e das convenções internacionais sobre a matéria.” Por sua vez, a mesma lei determina que o exercício da actividade de televisão (art. 60º, 3) deve obedecer a uma “lei especial que regula os mecanismos de licenciamento e as demais condições para o exercício da actividade de televisão”. Até à data, essa lei especial ainda não foi aprovada mantendo-se, assim, as emissões da TV Zimbo à margem da lei. A falta de informação pública sobre os proprietários da TV Zimbo adensou as suspeitas da sociedade, célere em especular, e de forma correcta, que tal acto de impunidade, no sector da comunicação social, apenas poderia partir do círculo presidencial. Criada a 27 de Dezembro de 2007, a TV Zimbo tem como accionistas o general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, chefe da Casa Militar do Presidente da República e ministro de Estado, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, chefe de Comunicações do Presidente da República e Manuel Vicente, presidente do Conselho de Administração e director-geral da Sonangol, que controlam, de forma equitativa, 99,96% das acções da televisão. Simbolicamente, o general Kopelipa distribuiu de forma igualitária, 0,04% das acções aos seus cabos mais leais, os coronéis José Manuel Domingos “Tunecas”, João Manuel Inglês, e Belchior Inocêncio Chilembo, assim como Domingos Manuel Inglês, seu assistente privado. A TV Zimbo, integra o património do grupo Media Nova. Este, por sua vez, anima a estratégia de controlo editorial do sector privado da comunicação social em Angola. A Rádio Mais, que emite em três províncias, nomeadamente Luanda, Huambo e Benguela faz parte do grupo Media Nova. A expansão desta rádio tem decorrido em paralelo com o impedimento governamental, há vários anos, de que a emissora católica de Angola, Rádio Ecclésia, emita em 10 províncias do país onde tem instalado repetidores de FM. O sector de imprensa da Media Nova inclui o semanário generalista O País, o Semanário Económico, a revista Exame Angola e a revista Chocolate. O jornalista João Van-Dúnem, antigo editor do serviço em português da BBC, é o presidente do Conselho de Administração do grupo Media Nova. O triumvirato Kopelipa, Dino e Manuel Vicente, como proprietários da Damer Indústrias S.A, surgem com um investimento público de cerca de 30 milhões de dólares para a construção de um moderno parque gráfico no país, a que baptizaram de Gráfica Damer. Essa gráfica, a maior do país, foi inaugurada a 13 de Novembro de 2008, pelo ministro da Indústria, Joaquim David. O grupo Medianova, cujo investimento inicial ultrapassa os 70 milhões de dólares, segundo quadros seus, tem a mesma estrutura accionista das suas subsidiárias. Os generais Kopelipa e Dino, assim como Manuel Vicente são os donos com quotas iguais. Os quatro subordinados do general Kopelipa os coronéis José Manuel Domingos, João Manuel Inglês e Belchior Inocêncio Chilembo, bem como o seu assistente privado Manuel Domingos Inglês exercem o papel de testas de ferro, com variações de 0,01% das acções cada a 0,02%, como no caso da Media Nova Marketing, criada para o controlo do mercado da publicidade. World Wide Capital Tendo realizado avultados investimentos , com fundos de origem desconhecida, no exterior do país, particularmente em Portugal, o ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República, general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, também exerce funções privadas além fronteiras. O general Kopelipa mantém-se, até à data presente, como membro do Conselho de Administração da World Wide Capital, SGPS, S.A, uma holding sedeada na residência do seu principal sócio em Portugal, Filipe Vilaça Barreiros Cardoso, na Avenida da Liberdade, em Lisboa. Esta empresa de que o general é o principal sócio, é o quarto maior accionista do Banco BIG, em Portugal, com 7,9% das acções. O presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente, que também figurava na lista dos accionistas do BIG, com 4,9% das acções, transferiu-as recentemente para uma empresa controlada pelo seu enteado Mirco Martins, conforme notícia do jornal Público, a 20 de Maio de 2010. O BIG mantém, sob custódia, os 469 milhões de acções que a Sonangol tem no maior banco privado português, o Millenium BCP, correspondentes a 9,6% do capital total da referida instituição financeira segundo o relatório e contas da Sonangol de 2008. A legislação angolana não permite que dirigentes angolanos acumulem funções públicas com privadas. Infere-se, pelo acto, que o poder do general Kopelipa está acima da lei. Lumanhe O general Kopelipa também se encontra formalmente representado no sector dos diamantes, como accionista da Lumanhe. A 13 de Fevereiro de 2004, um grupo de seis generais teve de ceder, de forma igualitária, quotas na empresa mineira Lumanhe a favor do actual ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República. Essa cedência ocorreu num momento de franca ascensão do poder do general Kopelipa e o seu controlo cada vez maior sobre as Forças Armadas Angolanas (FAA) e os sete generais passaram a dispor cada de 14.28% do capital. Os generais Armando da Cruz Neto, Carlos Hendrick Vaal da Silva e Adriano Makevela Mackenzie continuam activos em funções oficiais respectivamente como governador de Benguela, Inspector do Estado-Maior General das FAA, e chefe da Direcção Principal de Preparação de Tropas e Ensino do Estado Maior General das FAA . Os outros três generais dedicam-se hoje, exclusivamente, aos negócios e são os antigos chefe de Estado-Maior General das FAA, chefe do Estado Maior do Exército e chefe dos Comandos, nomeadamente João de Matos, e os irmãos Luís e António Faceira. Cinco dias depois da entrada do general Kopelipa na sociedade, a 18 de Fevereiro de 2004, o general Carlos Hendrick Vaal da Silva, assinou, como representante da Lumanhe, um acordo com a Endiama e a ITM Mining para o estabelecimento da Sociedade Mineira do Chitotolo. O Estado, através da Endiama, transferiu, por essa via, 15% do capital social do Chitotolo aos generais. A Lumanhe detém ainda 21% da Sociedade Mineira do Cuango (SMC), em parceria com a Endiama (41%) e a ITM Mining (38%). A SMC é responsável pela violação sistemática dos direitos humanos na vila de Cafunfo, na bacia do Cuango, onde detém uma grande concessão mineira. Homicídios, torturas, destruição de lavras, e policiamento arbitrário são parte dos actos de rotina da Sociedade Mineira do Cuango contra os aldeães e garimpeiros. A SMC goza da impunidade dos generais que lucram com o negócio. Um novo relatório sobre os direitos humanos na região está para breve. Um governo europeu também se encontra envolvido com os negócios obscuros dos generais. Trata-se do governo português. A 30 de Junho de 2009, o consórcio ITM Mining/Lumanhe terminou o contrato de operações na Sociedade Mineira de Calonda, onde mantinha uma participação de 50%, enquanto a Sociedade Mineira do Lucapa, detentora da concessão de exploração diamantífera, garantia a outra metade das acções. A Parpública SGPS, uma holding detida em 100% pelo Estado português, controla 81,13% do capital da Sociedade Portuguesa de Empreendimentos (SPE) que, por sua vez, detém 49% das acções da Sociedade Mineira do Lucapa. À estatal angolana Endiama cabe o capital maioritário. Conclusões O controlo privado da Presidência da República reflecte, de modo cabal, a prática sistemática do Presidente José Eduardo dos Santos em enfraquecer as instituições do Estado, chamando a si todos os poderes. Por conveniência pessoal, o presidente apenas atribui poderes reais aos seus escolhidos, independentemente do cargo, garantindo, assim, a supremacia do culto de personalidade sobre as instituições do Estado. Exemplo dessa prática são os excessivos poderes atribuídos ao chefe da Casa Militar do Presidente da República, general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”. O Estatuto da Casa Militar do Presidente da República (art. 21, 1, d) confere ao general Kopelipa o poder de representar o Presidente da República, função essa que constitucionalmente cabe ao vice-presidente da República e ao presidente da Assembleia Nacional. Durante anos, o general Kopelipa tem sido o principal responsável pelas negociações com a China e a gestão das suas linhas de crédito avaliadas, até à data, em mais de 10 biliões de dólares, na sua qualidade de director do Gabinete de Reconstrução Nacional.17 Nessa tarefa, o general tem tido, como seu principal colaborador o presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Manuel Vicente. Até à demissão do general Kopelipa do cargo de director do Gabinete de Reconstrução Nacional, em Abril passado, não há qualquer informação pública de que alguma vez esta instituição tenha prestado contas da aplicação dos fundos chineses e de outras operações, dentro e fora de Angola, e que envolvem a Sonangol. O papel do português Ismênio Coelho Macedo, como intermediário das operações ilícitas do general Kopelipa, coloca-o na privilegiada posição de um dos estrangeiros com maior influência nas decisões presidenciais sobre a economia política de Angola. O gestor é também o administrador do Banco Privado Atlântico, no qual a Sonangol detém 19,5% do capital. Na realidade, a política de tolerância zero contra a corrupção, anunciada pelo Presidente José Eduardo dos Santos, apenas serve de uma nova capa de encobrimento político da pilhagem do país por parte dos seus próximos. Por outro lado, a medida serve como expediente para garantir maior legitimidade internacional e assegurar o status quo. Ou seja, o país está a saque com apoio internacional. Esta constatação deve-se, em parte, à demonstração de falta de autoridade moral e política, por parte do Presidente José Eduardo dos Santos em refrear, no mínimo, os ímpetos dos seus mais directos colaboradores, que vulgarizam a Presidência da República e a esta conferem a imagem de um verdadeiro antro de ladrões e de corruptos. Os níveis incomportáveis de corrupção no aparato de segurança presidencial representam um grande perigo para a soberania do país e para a segurança do próprio presidente. O Estado e o presidente podem estar reféns de uma estrutura a que o académico camaronês, Achille Mbembe, considera de governo privado indirecto. Ou seja, o uso de funções públicas e deveres correspondentes, conferidos pela soberania nacional, por operadores privados e para fins privados. Ademais, o controlo privado das telecomunicações e da comunicação social pelos homens do presidente representa um verdadeiro golpe à possibilidade de democracia no país, para além do mero acto eleitoral. As acções do triumvirato formado pelos generais Kopelipa, e Leopoldino Fragoso do Nascimento e Manuel Vicente encontram terreno fértil numa sociedade onde os cidadãos lutam pela sobrevivência económica, física e moral, sem que prestem a devida atenção à funcionalidade do Estado. Todavia, o descaso da sociedade pelos efeitos nefastos da corrupção e da privatização da Presidência da República pode também criar um vácuo no poder institucional, pelo distanciamento dos actuais dirigentes, que trocaram o povo pelo dinheiro. Autor: Rafael Marques de Morais |
sábado, 14 de agosto de 2010
ANGOLA, UÉ
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1 comentário:
Onde arranja o meu Amigo estas info?
Se são fiáveis(A1)tiro o meu chapéu
Zé Luis
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