COM A DEVIDA VÉNIA
“Estimo ter podido concluir o hospital que mandei construir para descansardes dos vossos honrosos trabalhos. Em recompensa só vos peço a paz e o temor a Deus.
Princesa Maria Francisca Benedita
(Palavras proferidas na inauguração do Hospital dos Inválidos de Runa)
O Ministro da Defesa (isto é, o Governo) fez publicar o DL 193/2012, de 23 de Agosto, em que reorganiza o IASFA(1). Esta reorganização foi feita à revelia da direcção do próprio Instituto e à margem dos Ramos das FAs.
O que se perspectiva é um “assalto” do Governo aos bens do IASFA, um nivelar por baixo dos serviços prestados e um monopólio intolerável do mando por parte da tutela.
Tanto a anterior direcção do IASFA, como o Conselho dos Chefes Militares – que, aparentemente, se têm posto à margem de tudo isto, como se nada fosse com eles – não tiveram o mínimo cuidado em avisar os beneficiários do que se estava a preparar e se está a passar.
De igual modo nenhuma das Associações de Militares foi ouvida como é de lei(2), pelo que não se fizeram representar na tomada de posse do novo Conselho Directivo, no pretérito dia 1 de Outubro(3).
O comum dos militares e familiares abrangidos continua a sua existência como se nada se passasse, ou lhe dissesse respeito.
Convém fazer uma síntese histórica da assistência social na Instituição Militar, para melhor nos situarmos.
Em 1792 deu-se início à construção do Real Hospital dos Inválidos, em Runa, o qual foi inaugurado em 1827(4); em 1844 foi criado o Asilo dos Inválidos da Marinha. Só em 1925 foi criado o Cofre de Previdência dos Oficiais do Exército Metropolitano, seguido do mesmo, em 1927, para os Sargentos de Terra e Mar; em 1948 surgiu a Comissão Admnistrativa de Casas de Renda Económica e, em 1950, a Acção Social da Armada (ASA). Seis anos depois nasceu a Obra Social do Exército e Aeronáutica (OSEA).
A ASA e a OSEA fundiram-se, em 1958, no que veio a designar-se por Serviços Sociais das FAs (SSFA). No ano seguinte foi criado o Cofre de Previdência das FAs (CPFA); finalmente, em 1995 surgiu o IASFA que integrou os SSFA e o CPFA.
Com isto dito podemos sintetizar dizendo que o IASFA tem como principais funções a Acção Social Complementar (ASC), consubstanciada:
E, ainda, a gestão da ADM (Assistência na Doença aos Militares) depois de esta “valência” ter transitado dos Ramos, em 2005 – o que trouxe problemas acrescidos ao IASFA(6).
O universo abrange todos os militares e militarizados das FAs, no activo, reserva, ou reforma e seus dependentes (e ainda os civis titulares que se inscreveram até 1995), os quais descontam, obrigatoriamente, uma percentagem fixa do seu vencimento bruto, para o efeito. Actualmente esse desconto é de 1,5%, mas poderá ser rápida e discricionariamente aumentado.
O universo abrange todos os militares e militarizados das FAs, no activo, reserva, ou reforma e seus dependentes (e ainda os civis titulares que se inscreveram até 1995), os quais descontam, obrigatoriamente, uma percentagem fixa do seu vencimento bruto, para o efeito. Actualmente esse desconto é de 1,5%, mas poderá ser rápida e discricionariamente aumentado.
O “universo” totaliza cerca de 130.000 almas, dos quais apenas cerca de 45.000 são titulares pagantes.
A Direcção do IASFA era composta por três elementos (oficiais generais), um presidente e dois vogais, nomeados pelo MDN, ouvidos os Ramos. Este sistema era já pouco adequado, pois o conjunto do “povo pagante” não tinha uma palavra a dizer sobre quem ia gerir o dinheiro que obrigatoriamente descontavam, mas o novo organograma piora as coisas.
Tal deduz-se do facto do Conselho Directivo ser apenas constituído por duas pessoas (ou seja um dos Ramos nunca está representado), podendo os lugares ser ocupados por um civil qualquer, o que passou desde já a acontecer com o vogal, num processo de transferência de poderes pouco límpido, que apenas contou com o apoio do anterior presidente que, aliás, transita.
Convinha que tudo isto fosse clarificado para que o futuro não fique inquinado pela dúvida.
O problema maior do IASFA e a grande fatia da sua dívida de 64.337.435 euros (referida a 30/6/12) tem a ver com as dificuldades decorrentes do cumprimento das obrigações com a assistência na doença - ADM.
Os custos estimados da ADM referentes a 2011 são como segue:
Além destes custos o Estado suporta cerca de 30ME através do Serviço Nacional de Saúde (SNS), tal como acontece com os outros cidadãos que não tenha subsistema de saúde.
Os custos atrás apontados têm sido suportados através:
Ora não sendo os encargos com o SNS da responsabilidade da ADM, quer dizer que os beneficiários já suportam 52 dos 85ME totais, ou seja 65%.
Se as quotas recaíssem sobre os 14 meses e os subsídios – o que o MDN se apresta a fazer rapidamente – os 19ME cobrados passarão para 24.
Se o Estado actuar como fez com a ADSE e financiar 2,5% por cada titular, tal representaria cerca de 40ME, o que colocaria a ADM “sustentável”. Mas nada indica que tal se venha a verificar.
Entretanto todos os beneficiários penam meses a fio sem serem ressarcidos das comparticipações a que têm direito.
Todavia, pior do que tudo isto tem sido a queda provocada na ASC, que é o fulcro da acção do IASFA, e sobre a qual foram cortados 0,8% das quotas, o que colocou aquela em colapso eminente.
Acresce que a maioria dos beneficiários ainda deve pensar que dos 1,5% que descontam, 0,8% vai para a ASC e 0,7% para a ADM, o que devendo ser o correcto, deixou de se verificar.
Em conclusão tudo leva a crer que o MDN queira fazer com o IASFA o mesmo que os governos provisórios (pós 25/4), fizeram com a segurança social da altura: nacionalizaram-na, passando a gerir a seu bel-prazer a riqueza herdada dos privados, para cujo bolo o Estado não tinha gasto um tostão.
Só que agora não é para financiar quem para lá desconta, mas sim para desviar verbas para onde entender, degradando todos os serviços prestados de modo a “empurrar” os beneficiários para o negócio privado dos seguros e da banca.
Em face do exposto torna-se urgente eleger entre todos os militares uma comissão (caso as chefias não o queiram fazer), para saldar contas com o MDN; elaborar estatutos para levantar de novo o CPFA (ou algo semelhante) e preparar eleições gerais para se elegerem os respectivos corpos sociais.
Os militares não devem precisar de tutela política para o âmbito em causa. O Estado há muito que deixou de ser uma pessoa de bem e, ao contrário do que defendia a Princesa Benedita, os “nossos trabalhos também deixaram de ser honrosos”…
Se não conseguirmos levar este desiderato por diante, é porque merecemos bem, o que temos.
J. Brandão Ferreira
-----------------
-----------------
3 comentários:
Boa Noite,
Gostaria que me esclarecesse parte dos valores que apresenta, nomeadamente:
----------------------------
Os custos atrás apontados têm sido suportados através:
• Das quotas dos beneficiários, cerca de 19ME (sobre 12 meses e sem recair sobre os subsídios da condição militar e outros);
• Do copagamento no regime de acordos nos medicamentos e regime livre, cerca de 36ME.
Total - 55ME.
--------------------------
Tenho relativamente a este ponto as seguintes questões:
- Sendo a quotização de 1,5% como chegou ao valor de 19ME previsto como quotização?
- Porque considera o pagamento de 36ME de copagamento como um suporte ao financiamento dos custos da ADM. Os copagamentos são entregues à entidade prestadora do serviço e não à ADM.
Agradeço desde já o esclarecimento.
Ricardo Pedro
Não conheço como funciona o IASFA actualmente mas o meu conhecimento de como funcionava levaram-me, de há alguns anos a esta parte, a advogar a sua extinção. Pena é de quem agora se mostra tão pressuroso na sua defesa não tivesse cuidado em conhecer a situação que a instituição viveu durante larguíssimos anos e contribuir para a correcção das variadíssimas anomalias ( para não dizer coisas piores) que se verificavam.
Quanto às questões que o Sr Ricardo Pedro coloca:
Os 19 ME é um facto, não há nada dizer;
Do programa de saúde ADM, que no seu global devem atingir cerca de 160ME, os copagamentos são parte importante desse programa.
Cumpts
Brandão Ferreira
Enviar um comentário