segunda-feira, 2 de julho de 2012

POIS


José Luís Arnaut gosta de estar em todo o lado: na advocacia, na política, no futebol e agora na administração da empresa que distribui energia e gás natural ao mercado nacional. A capacidade multidisciplinar do dr. Arnaut não causaria nenhum mal ao país se a mesma não transformasse a fronteira entre o público e o privado numa nebulosa perigosa onde a subjugação do interesse público às necessidades dos privados é uma variável a ter em conta.
Passada quase uma semana após o i ter noticiado que o escritório CSM Rui Pena Arnaut tem a REN como cliente e produziu boa parte da legislação estruturante do gás natural e do restante sector energético, levantou-se um coro de críticas mas o assunto caiu no esquecimento.
A Ordem dos Advogados, em vez de tentar perceber se existe alguma incompatibilidade, ficou calada – como é costume quando está em causa algum dos cinco grandes escritórios. Enquanto a Ordem de Marinho Pinto nada faz, e o executivo de Passos Coelho permite, há um escritório de advogados que faz a legislação de um sector e aconselha empresas sobre essa mesma norma.
Refira-se que a situação do escritório do dr. Arnaut não é, de todo, caso único. Desde há muito que os sucessivos governos deixam que os grandes escritórios, por onde membros desses mesmos executivos passam, tenham acesso a informação privilegiada – mas sem que ninguém verifique eventuais incompatibilidades.
Nesse autêntico reino dos consultores jurídicos tudo é possível. Ainda no sector energético, o governo de Durão Barroso contratou em 2003 o escritório PLMJ (do qual Morais Sarmento, então ministro da Presidência do Conselho de Ministros, é sócio) para o aconselhar, juntamente com a Goldman Sachs de António Borges, na reestruturação do sector energético – mais uma. Uma das operações acompanhadas foi o acordo estabelecido entre o Estado e a ENI para a compra 34,3% do capital da Galp. A sócia que liderou a equipa jurídica da PLMJ era advogada de longa data de Américo Amorim. Quando este empresário quis entrar na Galp, em 2005, a mesma jurista deixou de representar o Estado para assessorar Amorim.
Outros exemplos podiam ser dados numa área onde os sucessivos governos têm facilitado muito. Um Estado forte não se entrega desta forma tão infantil a interesses privados. É necessário um escrutínio e uma regulação muito mais intensa  para defesa do interesse público. Este não pode ser a vítima habitual dos negócios.

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