segunda-feira, 30 de abril de 2012

ALERTA ESTÁ!!!!


                                                  O ESBULHO DAS PENSÕES


A ânsia de cortar nas despesas públicas e de aumentar as receitas para que o país recupere o mais rapidamente possível dos erros de governação cometidos desde há cerca de duas décadas, mais recentemente potenciados por uma imprevista conjuntura internacional e europeia altamente desfavorável, e que nos conduziram à situação calamitosa em que nos encontramos, tem um reverso que nos parece ainda mais grave do que o generalizado empobrecimento do país: a tendência para o acentuado agravamento das injustiças sociais.

Os desequilíbrios resultantes de medidas sectoriais urgentes e pouco amadurecidas que atingem exclusivamente determinados grupos de cidadãos, porque em determinado momento se consideraram as únicas possíveis para cumprir objectivos de curto prazo como é o de atingir metas preestabelecidas de redução do défice orçamental, têm levado á crescente desacreditação do tão apregoado princípio político de que “os sacrifícios são para distribuir por todos os portugueses”. Exceptuando-se naturalmente aqueles que se encontram em situações próximas ou abaixo do limiar da pobreza e que tendem a ser isentados de tais sacrifícios (o que até infelizmente nem sempre acontece), as substanciais distorções no nível dos sacrifícios crescentemente exigidos aos diferentes cidadãos, a nível remunerativo, fiscal, de condições de trabalho, de apoio social, etc., criam nos que justificadamente se sentem injustiçados um sentimento de revolta nada saudável no que respeita ao normal funcionamento de um estado de direito democrático como supostamente é o nosso.

E mais acentuado se torna ainda o sentimento de revolta quando se gera a sensação de que haveria alternativas viáveis para uma mais equilibrada distribuição dos sacrifícios, pelas quais o poder político não quis optar por falta de coragem ou, pura e simplesmente, para proteger determinados grupos sociais ou interesses partidários. Acresce ainda a sistemática invocação do acordo com a “troika” como “desculpa de mau pagador” para justificar todas as medidas impopulares tomadas, mesmo quando elas não se constituem substantivamente como uma imposição directa, objectiva ou premente desse acordo.

O povo português, na sua genética paciência, aceita resignadamente níveis de sacrifícios impensáveis para outros povos civilizados, quando se sente bem liderado, sobretudo pelo reconhecimento do exemplo das elites que o governam em termos de probidade, competência e determinação nas respectivas atitudes e comportamentos políticos. Não só para o bem, como algumas vezes até para o mal, conforme a História o tem demonstrado. Mas a História também tem demonstrado que a sua confiança nas classes políticas se vai perdendo à medida que cresce a percepção da fraqueza da sua capacidade de liderança, quer por manifesta incompetência quer, muito especialmente, por subversão, descontrolo ou mesmo descarado atentado aos princípios e à coerência ética que deveriam reger as condutas dos poderes públicos. E mais rapidamente se perde ainda tal confiança, quando se generaliza o sentimento de que muitas das figuras públicas, que ocupam cargos políticos, lutam por ascender a esses cargos mais para se servirem a si próprios e aos seus restritos grupos de interesses e compadrios do que para servir o País e a colectividade nacional.

Vem este preâmbulo a propósito de uma das visíveis injustiças que o actual Governo vem alimentando, sempre com o estafado argumento de que não há dinheiro para financiar nada que não seja sustentável, ao continuar na senda iniciada pelo anterior Governo, de penalizar progressivamente as pensões, exceptuando naturalmente aquelas que, como já atrás referimos, se encontram em patamares muito baixos.

Entretanto, o cidadão comum, sobretudo o que teve uma longa carreira contributiva, pergunta, muito justificadamente, o que fizeram dos seus descontos de uma vida inteira de trabalho, acrescidos naturalmente das correspondentes comparticipações das entidades patronais (incluindo o Estado quando se trate de funcionários da administração pública), para lhe porem agora em causa os direitos adquiridos no quadro legal que regeu as suas legítimas expectativas ao longo dos anos, no que respeita à sua pensão de reforma ou aposentação?

A escassa informação de que dispomos, pela enorme dificuldade que há em obter dados consistentes sobre esta matéria, não nos permite responder de forma clara e precisa, como gostaríamos, a tão pertinente pergunta. Contudo, isso não nos impede de colocar várias questões que consideramos muito relevantes para uma análise séria sobre o assunto.

É um facto indesmentível que a esperança de vida tem vindo a aumentar, o que se traduz obviamente num aumento progressivo dos recursos necessários para financiar a segurança social, não só em termos de pensões e subsídios como na área da saúde. Por outro lado, a isso se junta, agravando ainda mais a situação, o crescimento substancial do desemprego, em consequência não só da contracção da economia, mas também da contracção de efectivos que está a ocorrer no funcionalismo público. Torna-se, portanto, óbvio que o aumento da população inactiva e o decréscimo da população activa convergem de forma muito prejudicial à requerida sustentabilidade do sistema de segurança social.

Porém, temos fortes razões para considerar que o sistema, pelo menos no que às pensões respeita, deveria ter mantido um “volante” financeiro constituído pelos descontos passados dos trabalhadores e entidades patronais, em níveis que assegurassem a manutenção do volume das pensões de aposentação, reforma e sobrevivência já atribuídas segundo as regras que na altura vigoravam. Isto é, manter uma provisão bem gerida para este fim, uma vez que os descontos efectuados só a este fim se deveriam destinar, e não a outros, princípio que de facto, não temos dúvida em afirmá-lo, tem vindo a ser desvirtuado.

E aqui se podem então levantar várias questões.

A primeira questão é a de saber se o referido “volante” (provisão ou fundo) foi efectivamente bem gerido ou se foi aplicado em activos de risco que conduziram a perdas substanciais do seu valor, conforme há alguns anos chegou a ser noticiado em determinados órgãos de comunicação social. Se isto aconteceu de facto, o cidadão comum tem o direito de saber toda a verdade sobre o assunto e de inquirir-se sobre se alguém foi punido pela respectiva irresponsabilidade e gestão danosa.

A segunda questão, que respeita exclusivamente à administração pública, é a de saber se o Estado (como entidade patronal dos seus funcionários) sempre cumpriu os deveres que legalmente lhe cabiam nesta matéria, ou se mantem dívidas passadas que procura esquecer. A mesma dúvida se pode colocar em relação às transferências devidas pelo Estado e pelas empresas públicas à Segurança Social, relativamente aos trabalhadores assalariados e outros que trabalharam em funções públicas, sem quaisquer descontos para a Caixa Geral de Aposentações.

A terceira questão, semelhante à anterior, mas aplicável ao sector privado, é a de se saber, qual o efectivo nível de dívidas das empresas à Segurança Social e o que tem sido feito para as recuperar.

A quarta questão, é a de se saber em que medida, e até que ponto, o Estado tem utilizado esse “volante” para fins diferentes daqueles a que ele verdadeiramente se deveria destinar, ou seja, o exclusivo pagamento de pensões de aposentação, reforma e sobrevivência. É que, em nossa opinião, os subsídios de desemprego, pensões atribuídas a quem nunca descontou um centavo, actualizações automáticas de pensões atribuídas por lei a determinados grupos profissionais sem qualquer suporte de um fundo de pensões integrado no sistema, etc., não negando a extrema necessidade de dar apoio a quem dele precisa, na maioria dos casos por fortes imperativos de natureza social, não deveriam contudo constituir uma carga a suportar só por aqueles que descontaram, ao longo de uma vida de trabalho, para obterem o direito à sua reforma. No caso específico dos subsídios de desemprego, torna-se quanto a nós indispensável que este encargo passe a ser suportado pelo orçamento do Estado e não pelo sistema previdencial da Segurança Social, não só porque o flagelo social do desemprego deve ser moralmente suportado por todos os cidadãos, mas também porque tal medida iria contribuir para uma maior convergência daquele sistema com o sistema previdencial da Administração Pública.

O Estado tem todo o direito e o indiscutível dever de assistir os seus cidadãos em maiores dificuldades, mas deve fazê-lo com os recursos financeiros que recebe de todos os cidadãos que pagam impostos, e não só de uma parte deles, como acontece se as situações atrás elencadas forem tidas como um dever de solidariedade a partilhar, exclusivamente, pelos que trabalharam e descontaram para as respectivas pensões de reforma ou aposentação. Assim, de facto, o sistema nunca pode ser sustentável! E sobretudo em situações de prolongada crise económica e social, em que as prestações sociais de carácter transitório tendem a crescer exponencialmente.

A quinta e última questão respeita aos impostos. Nesta matéria, assiste-se presentemente a uma inversão, iniciada em 2011 mas mais consistentemente imposta a partir do corrente ano de 2012, no tratamento fiscal dos pensionistas relativamente aos trabalhadores activos. O reconhecimento de que algum benefício fiscal daqueles relativamente a estes se justificava devido ao normal crescimento das despesas de saúde, em consequência da idade mais avançada ou limitações físicas dos aposentados, foi rapidamente substituído pelo conceito de que a necessidade de cortar nas despesas públicas da segurança social justificam os cortes nas pensões, ainda que tal desiderato se tenha de conseguir à custa do aumento da receita fiscal em sede de IRS. E o facto é que para 2012 se verifica um agravamento do IRS dos pensionistas, relativamente a idênticos rendimentos do trabalho, ainda maior do que aquele que já tinha ocorrido em 2011, concretamente nos seguintes casos:
a) Para pensões superiores a 1.000 euros, patamar a partir do qual todas são afectadas pelo facto da dedução específica de 6.000 euros aos rendimentos anuais brutos das pensões, que vigorava em 2011, ter descido abruptamente para 4104 euros (idêntica à dos rendimentos do trabalho);
b) Um agravamento adicional para pensões mensais superiores a 1875 euros mensais, porque a dedução específica de 4104 euros (fixa para os rendimentos do trabalho) começa a ser gradualmente reduzida a partir desse patamar, até à sua total extinção para pensões superiores a 4.000 euros;
c) Ainda mais um agravamento adicional aos anteriores, para as pensões superiores a 3.000 euros mensais, devido ao crescente desfasamento da progressividade das taxas acima desse patamar, relativamente às taxas dos rendimentos do trabalho, uma vez que o respectivo escalonamento foi construído por forma a se atingir o escalão máximo de 40% nas pensões superiores a 9.200 euros, enquanto que para os rendimentos do trabalho tal escalão máximo só é atingido nos rendimentos mensais superiores a 25.000 euros!

Assim, nada nos garante que, ao enveredar-se por este perigoso caminho de discricionária prepotência, o agravamento da situação fiscal dos pensionistas, relativamente aos demais tipos de rendimentos, não continue a constituir uma regra, despudoradamente discriminatória, que de ano para ano vá incidindo progressivamente sobre patamares de pensões cada vez mais baixos e carregando cada vez mais nos mais altos, num total desrespeito pelos princípios constitucionais da igualdade e da equidade fiscal e pela consideração que deviam merecer os pensionistas com longas carreiras contributivas. E ainda por cima sem que por esta via (a fiscal) se esteja a contribuir de alguma forma para a sustentabilidade do sistema previdencial do Estado, uma vez que o IRS cobrado aos pensionistas não fica consignado a esse fim. Dito por outras palavras, os pensionistas estão a ser crescentemente penalizados relativamente a todas as demais categorias de rendimentos, sem que isso contribua em nada para a sustentabilidade das suas pensões.

Se isto não é um premeditado esbulho, então a que situações diferentes destas é aplicável tal termo?

O argumento da “falta de dinheiro” não pode justificar a leviandade com que se tratam matérias tão sensíveis como esta. Os pensionistas que recebem pensões acima dos 1.000 euros mensais (para já não falar dos cortes dos 13º e 14º meses que afectam todas as pensões acima de 600 euros) têm toda a razão em sentir-se totalmente desconsiderados e esbulhados pela forma como estão a ser tratados. E até porque, como se disse, nos parece estar claramente em causa a constitucionalidade da discriminação negativa dos pensionistas, quer por atentado ao princípio da igualdade, conforme definido no Art. 13º da CRP, quer por manifesta desconformidade com o seu Art. 104º (Impostos), não se compreendendo mesmo como se vai aplicar uma taxa única nas situações de acumulação de rendimentos de pensões com rendimentos de trabalho, tanto no caso de um titular como de dois titulares.

Creio que só há uma via para tentar pôr cobro a esta inadmissível discriminação contra os reformados e aposentados. Dado que não há sindicato para os defender, restaure-se o movimento dos pensionistas, com vista a ressuscitar o “partido dos reformados” (que até já teve uma efémera existência) com esta ou qualquer outra designação melhor. Ele seria agora mais oportuno do que nunca. Só com deputados na Assembleia da República, que tirem lugares aos partidos instituídos, se podem verdadeiramente defender os legítimos direitos dos pensionistas.

Porém, um partido político não deve ter um ideário restritamente corporativo. Junte-se-lhe o ideário da luta pela moralização e decência da vida política nacional, do repúdio pelos compadrios geradores de incompetência e laxismo nos cargos públicos, do combate à corrupção e aos vergonhosos favorecimentos de interesses privados a custa do erário público! São afinal ideais certamente muito caros a quem teve uma vida honesta de trabalho.

Para isto, não há que pensar em alinhamentos às esquerdas ou às direitas políticas, porque em todas elas cabe este ideário desde que as pessoas que o perfilhem sejam íntegras de carácter e tenham o sentido da virtude e da justiça, independentemente das suas convicções políticas ou religiosas.

Vou divulgar este texto. Peço a quem concordar com a sua essência, o favor de continuar a divulgá-lo. Assim haja bem intencionados suficientes que queiram e possam dar corpo a esta sugestão.


JOSÉ MANUEL CASTANHO PAES

Pensionista da Caixa Geral de Aposentações (com 48 anos de descontos).

     

     
               



        



1 comentário:

Unknown disse...

Por estar totalmente de acordo com o texto, faço votos que a iniciativa de dar voz aos reformados e pensionistas, divulgarei o mais que puder esta mensagem.
Um grande bem haja.
Joaquim P. Rodrigues