terça-feira, 11 de setembro de 2012

AGUENTA MARUJO



A liquidação do Colégio Militar

por MIGUEL FÉLIX ANTÓNIO
Parece estar em curso, de forma consolidada, a execução dos processos que têm como objectivo, ainda que a prazo, o encerramento do Colégio Militar. Pelo menos do Colégio que em 1803 foi criado por António Teixeira Rebelo e que eu na década de 70 do século passado e muitos outros nesta e noutras décadas frequentámos.
Não discuto a legitimidade formal do Governo para avançar para a extinção deste estabelecimento militar de ensino. Mas não deixa de ser curioso que estejamos perante o epílogo do que da matéria constava no Programa com que o Partido Socialista se apresentou aos portugueses na sequência do golpe militar de Abril de 1974.
À época o motivo apresentado para a extinção era a de que se tratava de um colégio elitista!
Bem sabemos que os partidos em muitas coisas acabam por ser todos muito parecidos...
Mas vamos à substância.
As razões, entre outras, que têm sido apresentadas devem ser discutidas:
- Existência de elevados constrangimentos de ordem financeira, por parte do Estado português;
- Diminuição dos candidatos à frequência do Colégio Militar, com a correspondente diminuição das receitas provenientes do pagamento de propinas, e a interpretação, legítima sem dúvida, de que tal decréscimo de concorrentes consubstancia um afastamento e desinteresse pelo Colégio e quiçá pelo que ele representa;
- Reduzido número de alunos que, no final do curso, escolhe como destino profissional as Escolas Superiores de Ensino Militar (Escola Naval, Academia Militar e Academia da Força Aérea).
Não procurando negar factos mais ou menos verdadeiros, importa sobretudo ir à raiz dos problemas e à sua interpretação.
Ao Estado, entre larguíssimas e excessivas funções, cabe promover o ensino e a formação dos jovens, nas suas múltiplas vertentes, e também dignificar os valores que se podem considerar integrantes da identidade nacional.
Penso que poucas dúvidas haverá de que o Colégio Militar é um importante instrumento para o cumprimento de tais objectivos, bem como de que a preparação global dispensada aos seus alunos tem provado nos mais variados sectores e áreas da vida nacional.
Independentemente de ran-kings, também julgo que poucos serão os que sustentam que o Colégio não constitui um bom exemplo para outras escolas do nosso país.
Relativamente aos aspectos de ordem financeira, deve debater-se se é mal empregue o dinheiro gasto num estabelecimento de ensino como o Colégio Militar, mas em contrapartida é bem despendido com o rol, que seria fastidioso enumerar, de organismos públicos e associações privadas de duvidosa utilidade pública pagas pelo Estado, entre as quais estão escolas de ensino superior de duvidosa utilidade, semeadas a eito muitas vezes apenas e só para satisfazer caprichos pessoais e locais, bem como milhares de freguesias e centenas de municípios sem qualquer racionalidade.
Situações transitórias, de emergência económica e financeira como a que vivemos, não devem pôr em causa símbolos da nossa Pátria, como é certamente o caso do Colégio Militar com mais de dois séculos de existência.
No que toca ao argumento, de que cada vez são menos os candidatos à frequência do Colégio Militar, talvez valha a pena saber quais as razões. Será que os poderes públicos têm tomado as medidas tendentes à prestigiação da instituição militar, matéria tão presente nos discursos, mas com fraca materialização na acção política? E esta vertente entronca no debate nacional nunca feito de forma séria sobre a necessidade da existência de Forças Armadas em Portugal.
Quanto ao aspecto de que são poucos os alunos finalistas do Colégio Militar que optam pela carreira das armas, pergunta que deve ser feita é se as competências e qualificações absorvidas durante o curso não são também muito relevantes no desempenho de outro tipo de actividades, da economia às ciências, às artes e à cultura, nas empresas e na administração pública, conforme aliás o comprovam os antigos alunos que se destacaram nesses sectores.
Apesar de tal não constar do Programa do Governo sufragado no Parlamento mais valia que se tivesse a coragem de dizer que este modelo já não serve, retirando as devidas consequências, que deveriam ser o encerramento puro e simples do Colégio Militar.
Bem melhor do que travesti-lo e fazê-lo agonizar durante alguns anos, conforme tudo indica serão as consequências do despacho recentemente publicado em Diário da República sobre o tema.

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