9/1/12
Com a devida vénia, transcrevemos;
“Tinham-nos
dito, no momento em que deixámos a terra natal, que partíamos em defesa dos
direitos sagrados que nos são conferidos por tantos cidadãos instalados lá
longe, tantos anos de presença, tantos benefícios concedidos às populações que
têm necessidade do nosso auxílio e da nossa civilização”. “Pudemos verificar
que tudo isso era verdade e, visto que era verdade, não hesitámos em derramar o
imposto de sangue, em sacrificar a nossa juventude, as nossas esperanças. Não
lamentamos nada, mas enquanto aqui este estado de espírito nos anima, dizem-me
que em Roma se sucedem as intrigas e as conspirações, se desenvolve a traição e
que muitos, hesitantes, perturbados, cedem com facilidade às tentações do
abandono e aviltam a nossa acção”. “Suplico-te, tranquiliza-me o mais breve
possível e diz-me que os nossos concidadãos nos compreendem, nos defendem, nos
protegem como nós próprios protegemos a grandeza do império”. “Se tudo fosse
diferente, se tivéssemos de deixar em vão os nossos ossos embranquecidos sobre
as pistas do deserto, então, cuidado com a cólera das Legiões.”
Marcus
Flavinius, Centurião da 2ª Coorte da Legião Augusta, a seu primo Tertulius
Da
análise da História Militar sabe-se que desde os Assírios, os Persas, os
Egípcios, os Macedónios, os Gregos, os Romanos, etc., que os motins militares
têm origem, fundamentalmente, em três coisas: o não pagamento atempado do soldo
(donde deriva a palavra soldado) devido; quando se interfere aleatoriamente na
carreira (sobretudo na Idade Moderna) e quando os militares se sentem
atraiçoados por quem os tutela.
Foi
sempre assim e não se vislumbra (dada a natureza humana), que possa mudar.
Acontece
que as numerosas malfeitorias que têm sido feitas à Instituição Militar (IM) e aos
militares, por parte de sucessivos governos nos últimos vinte e tal anos - o
que representa um passivo de problemas acumulado, único em quase 900 anos -
vieram, por sorte vária, confluir no actual governo e chefias militares, em
que:
- Relativamente
ao soldo ainda não deixaram de pagar (embora já tenha havido um atraso de um
dia, no ano passado, no Exército), e há mais de 10 anos que a rubrica de
“pessoal” é sistematicamente sub - orçamentada, mas fizeram pior, fizeram
regredir cerca de 4000 militares à tabela remuneratória de 31/12/2009. Uma
coisa inaudita, que certamente nunca ocorreu em nenhum país, nem na “América
Latrina”! E tudo depois de um conjunto de episódios pouco dignificantes cuja
origem primeira, foi terem querido meter os militares na tabela salarial da
função pública. O que à partida nunca devia passar pela cabeça de ninguém, já
que um militar jamais poderá ter um estatuto de funcionário público!
Relativamente
à “carreira” - que nos militares adquire uma importância que não tem paralelo
em qualquer outra profissão - o actual congelamento das promoções faz com que o
decreto-lei 373/73 (que deu origem ao 25 de Abril), pareça uma brincadeira de
crianças. Julgo que não preciso de dizer mais nada.
E
quanto ao facto dos militares se sentirem atraiçoados, ainda se pode distinguir
três vertentes: o “Comandante Supremo” (que aliás não manda nada), que
desapareceu, aparentemente, em combate; os governantes que não sabem o que
querem, não têm política para coisa alguma, a não ser para os 3Rs - reduzir,
reduzir e reduzir - não cumprem leis que aprovam, mudam regras a meio do jogo e
têm, numa palavra, destruído paulatinamente uma Instituição sem a qual o País
não se sustém; e sentem-se também atraiçoados pelas chefias militares, pois não
têm ninguém que os defenda.
Não
contentes, porém, em deixar medrar uma das razões que historicamente levam a
motins nas forças militares, juntaram-nas todas três, em simultâneo.
Convenhamos que era difícil fazer pior em qualquer parte do mundo!
Ora
tal só é possível com enorme irresponsabilidade, incompetência, arrogância e
muita falta de prudência.
E
por terem encontrado pela frente muita gente capaz, disciplinada, com espírito
de serviço e de missão, que anda há 20 anos (muito tempo antes da crise) a dar
exemplo de contenção de despesas, reorganização e redução que, sem estar isento
de erros ou críticas, não tem paralelo em mais nenhuma área do Estado. Mais
ainda, apesar dos cortes constantes em tudo, ainda não se deixou de bem cumprir
nenhuma missão atribuída, nem se envergonhou (antes pelo contrário) as armas
lusas e o País, nos numerosos teatros de operações espalhados pelo mundo, onde
marcou presença nos últimos 25 anos.
Não
vai ser possível aguentar mais este estado de coisas.
Os
contemporâneos julgam, quase sempre, que determinados eventos pertencem ao
passado ou só acontecem aos outros.
E,
por norma, só descobrem que estão enganados demasiadamente tarde.
João
José Brandão Ferreira
TCor/Pilav(Ref.)
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